A empregadagem
Há uns anos cruzei-me com uma figura que era a mais pura caricatura do patrão "má-onda" para com os seus empregados. Para começar, só estabelecia contacto verbal com algum deles em momentos de absoluta e imperiosa necessidade. Toda a comunicação habitual passava pelo encarregado delegado para essas funções menores. Perante terceiros, clientes, fornecedores, banca e mais que fosse, quando queria referir-se ao seu quadro de trabalhadores, recorria à expressão "a empregadagem". Cultivava assim com esmero uma imagem de marca da frieza, falta de consideração e de respeito para com todos os que dependiam da sua boa-vontade. Quem observava por fora, como era o meu caso, intrigava-se sobre o tipo de motivação necessária para conseguir lidar com tal besta.
Uns anos mais tarde, soube que a empresa tinha fechado. Pode ter sido apenas em resultado de uma qualquer das crises que nos assolaram nos últimos anos, mas quando soube disso lembrei-me da dificuldade que alguém assim terá em conseguir quem aceite trabalhar com ele.
Já passaram mais uns anos e não sei o que é feito de tal figura, mas ontem, quando soube que o Bloque de Esquerde, entre 2022 e 2024, tinha despedido cinco trabalhadoras, mães há pouco tempo, lembrei-me novamente dele. Imagino que ninguém de ânimo leve despeça a mãe de um bebé, especialmente em período de amamentação. Cinco será ainda mais difícil, mas um acto de gestão é um acto de gestão. Por vezes é necessário sacrificar uma parte da organização, para que seja possível salvar o resto. Quem está por fora não imagina como estas decisões serão difíceis .
Depois desta notícia, dei por mim com uma imagem menos negativa do mete-nojo que tratava os seus funcionário por "empregadagem". Pelo menos nunca o ouvi armado em moralista, nem em escanção da ética dos outros.