A efemeridade do poder
Desconheço se em Portugal as pessoas se têm apercebido da forma como as autoridades de Pequim, pela mão da poderosa estrutura do Partido Comunista Chinês, têm levado a cabo uma profunda operação de limpeza em relação àqueles elementos que tendo atingido posições de grande destaque na hierarquia chinesa, mais ostensivamente exibiam a sua riqueza, poder e impunidade.
Têm sido vários os casos, mas aquele que mais está a dar que falar é o do até há pouco tempo intocável Zhou Yongkang. Filho de uma família pobre de Jiangsu, depois de ter começado a carreira na área do petróleo e da indústria do gás, Zhou Yongkang foi vice-ministro da Indústria do Petróleo (1985-1988), subindo na estrutura até atingir o topo da China National Petroleum Corporation. A partir daí foi ministro da Terra e dos Recursos Naturais, chefe do PCC em Sichuan, tendo desempenhado vários outros cargos até se tornar no homem que dominava todo o aparelho de segurança da RPC. Zhou Yongkang foi o ministro da Segurança Pública entre 2002 e 2007, assumindo logo depois o cargo de secretário da Central Politics and Law Comission. Membro do Comité Permanente do Politburo do PCC, Zhou retirar-se-ia em 2012, após o 18.º Congresso do PCC.
Actualmente são cinco os membros da sua família que são alvo de investigações, na linha das que levaram à queda em desgraça, no curto espaço de um ano e meio, de Li Dongsheng (vice-ministro da Segurança Pública), Li Chongxi (Presidente da Divisão Provincial de Sichuan da CPC do PCC), Tang Hong (membro da unidade paramilitar de polícia do Ministério da Segurança Pública), Yu Gang (adjunto da Politics and Law Comission), Guo Yongxiang (Presidente do Círculo das Artes e Literatura de Sichuan), Ji Wenlin (vice-governador da Província de Hainão), Jiang Jiemin (Presidente da SASAC) e de Li Chuncheng (vice-secretário do PCC em Sichuan), sem esquecer Bo Xilai, antigo dirigente máximo do PCC em Chongqing, entretanto condenado a uma pena de prisão perpétua por corrupção e abuso de poder.
Mas o que há de mais extraordinário no caso de Zhou Yongkang é que se tratava de um verdadeiro czar. É até hoje o mais alto dirigente do PCC a ser visado num processo desta natureza. Não se trata, pois, de peixe miúdo. O filho, Zhou Bin, tendo-se licenciado em 1994 na Universidade do Texas, em Dallas, construiu um império à sombra das influências do pai. Zhou Bin, sem que se lhe reconheçam especiais capacidades, tornou-se detentor de vastas participações em empresas da área do petróleo, do imobliário e até da indústria cinematográfica, sendo que uma das suas empresas - Zhongxu Sunshine Energy Technology - vende equipamento à China National Petroleum Corporation.
Esta manhã, Gillian Wong escreveu um artigo no Macau Daily Times que pode ajudar a perceber melhor o que se está a passar. Para o South China Morning Post, também de hoje, que citava fontes do inner circle do PCC, Xi Jinping está à procura do seu lugar na História, ao lado dos grandes do PCC. Só que para isso acontecer terá de consolidar o seu poder e enfraquecer a resistência interna às suas reformas. Em vez de se deixar ficar quieto e sem levantar grandes ondas, como fez o seu antecessor, o actual n.º 1 decidiu marcar o caminho.
No próximo mês terá lugar o encontro de Beidaihe e Xi Jingping continua a cumprir a agenda que prometeu. Quando em 2012 assumiu o poder declarou uma guerra sem quartel à corrupção que minava o PCC e toda a sua estrutura de poder. Ao apertar o cerco a Zhou Yongkang, Xi Jingping não podia ser mais claro. Ninguém está acima da lei, não há intocáveis. E os reformados ricos não serão poupados. A mensagem vai chegar a todo o lado. Espera-se que a Portugal também.