A distopia chinesa
Já aqui postei sobre a ameaça que o regime chinês constitui para a nossa liberdade. A previsibilidade e a capacidade de decisão a longo prazo dos regimes autoritários em geral podem ser atractivos, especialmente em tempos conturbados.
Vivo com a triste convicção de que existe uma parte significativa da nossa espécie que não aprecia assim tanto a liberdade. Quando na história pessoal de um individuo existem falhas frequentes de bens essenciais como sendo refeições regulares, habitação e a possibilidade de planear o futuro, então a liberdade de expressão pode ser considerada como um preço aceitável para que se consiga assegurar os básicos. Encontramos isso actualmente em muitas geografias e também na nossa história bem recente. As carências materiais explicam essa falta de apreço.
O sucesso material chinês é por isso um desafio à própria lógica autoritária sob a qual o regime assenta. Até que ponto os seus cidadãos estarão dispostos a pagar esse preço? Os chineses sabem que se aceitarem as regras poderão prosperar e, pelo contrário, se as questionarem o regime desencadeará os procedimentos definidos para esses casos.
O confinamento que se vive actualmente em Shangai resulta de uma rígida política de Covid zero, assim como mostra que a vacina chinesa da Sinovac é francamente menos eficaz do que as que foram produzidas na Europa e EUA.
Apesar da censura chinesa que pretende filtrar toda a informação que sai do país, têm chegado ao ocidente alguns vídeos que mostram o desespero de quem está aprisionado em casa, guardado por cães robotizados e por drones equipados com câmaras e com altifalantes que transmitem as instruções do partido. Para os que se atrevem a contrariar as instruções, as autoridades não hesitam em recorrer às agressões, independentemente da idade do prevaricador. Crianças ou velhos, todos são agredidos até entenderem quem é que manda ali.
Segundo o jornal britânico Independent alguns drones voam em frente às varandas dos apartamentos apelando à calma de todos os que estão impedidos de sair de suas casas. Pelos seus altifalantes debitam frases como: “Por favor cumpram as restrições Covid. Controlem o desejo da vossa alma por liberdade. Não abram as janelas nem cantem.”
Perante estas frases fico sem saber como terminar o postal.