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Delito de Opinião

A Constituição espanhola e os novos partidos

Diogo Noivo, 19.12.15

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A Constituição espanhola goza de legitimidade democrática reforçada. O texto constitucional foi elaborado e aprovado por uma Assembleia Constituinte e, posteriormente, foi submetido a referendo onde obteve a validação da esmagadora maioria dos espanhóis. É por isto que habitualmente se considera que a Constituição espanhola de 1978 tem dupla legitimidade eleitoral. Porém, a ordem político-constitucional de Espanha dispõe ainda de um terceiro argumento de força: a Lei da Reforma Política, aprovada em 1976. Com apenas cinco artigos e igualmente submetida a referendo, a Lei da Reforma Política foi o instrumento legal que desmantelou todo o edifício franquista e que, de facto, permitiu a transição da ditadura para a democracia.

 

Apesar dos quarenta anos passados e do amplo apoio popular no qual está fundada, a arquitectura política de Espanha é porventura o aspecto mais importante das eleições deste domingo, sobretudo para os novos partidos. O Podemos (tal como a nova liderança da Izquierda Unida) declarou o propósito de romper esta ordem, pondo fim à predominância dos dois partidos tradicionais e à monarquia. A corrupção, as “castas” e os abusos da política espanhola são, para o Podemos, o corolário lógico de um sistema político bipartidário onde o Chefe de Estado é coroado. Claro que este argumento não resiste ao escrutínio mais primário pois dele resulta a conclusão que em repúblicas pluripartidárias não existe corrupção, tráfico de influências, nem compadrios. Mais do que propostas novas e soluções, toda a estratégia de Pablo Iglésias, líder do Podemos, assenta numa acção depredatória que se apropria da insatisfação popular para arrasar o sistema que resultou da Transición.

 

Já o Ciudadanos optou pela via mais difícil em tempos de nervos à flor da pele. Como partido recente e saído do caldo político catalão, o Ciudadanos precisava de fazer barulho para conquistar o palco nacional. Ainda assim, optou por defender a ordem constitucional, reiterando que foi essa ordem que permitiu a união dos espanhóis – referência implícita aos traumas profundos deixados pela Guerra Civil, à Transição, ao combate à ETA, à independência da Catalunha e aos demais desafios que ameaçaram (e ameaçam) o equilíbrio institucional em Espanha. Embora critique o duo PSOE-PP, afirme a necessidade de reformas políticas estruturais e apele à elevação dos movimentos cívicos contra as más práticas do sistema, o espírito conciliatório e de preservação de uma ordem político-constitucional amplamente validada pela sociedade espanhola parece fazer de Albert Rivera, presidente do Ciudadanos, um digno sucessor de Adolfo Suárez e da sua política de pactos.

 

Independentemente dos arranjos partidários que o resultado eleitoral de domingo venha a permitir, vai ser interessante ver qual destas duas visões sairá vencedora.

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