A caminho do 26J (VI) – A recta final
Espanha entra hoje na última semana de campanha eleitoral. Mantém-se no horizonte a forte possibilidade de obliteração dos socialistas às mãos do Unidos Podemos. Por essa razão, a coligação de extrema-esquerda aposta tudo no voto útil. O discurso de recta final assenta num quadro eleitoral binário: ou vence o Partido Popular, um partido do “sistema”, da “casta”, dos “corruptos”; ou vence o Unidos Podemos, o projecto da “regeneração”, da “esperança”, da “refundação moral” do regime.
Pelo meio, Pablo Iglesias, líder do Podemos, lançou uma hábil ofensiva à direcção nacional do PSOE. Em conversa com jornalistas, confessou admirar José Luis Rodríguez Zapatero, antigo Primeiro-Ministro e antecessor de Pedro Sánchez na liderança do PSOE. O cabeça de lista do Unidos Podemos alardeou as excelentes relações pessoais que mantém com Zapatero, acrescentando que procura com frequência aconselhamento junto do antigo Presidente de Governo, o “melhor de sempre”, na sua opinião. Com estas declarações, Pablo Iglesias quis reclamar para si o estatuto de viúva política do zapaterismo (se é que tal coisa existe) e, dessa forma, debilitar a direcção nacional do PSOE, já muito fragilizada pelo resultado que obteve nas eleições de 20 de Dezembro e, pior, pelo resultado que sondagens adivinham para o próximo domingo. Os socialistas reagiram com notório enfado. Tentaram virar o discurso de Iglesias, dizendo que se este tem tanto apreço por Zapatero o melhor que tem a fazer é unir-se às fileiras socialistas, sobretudo dado o novo amor de Iglesias pela social-democracia. No entanto, da resposta dos socialistas apenas sobreveio nervosismo e algum desespero. O PSOE está à porta do sepulcro onde já descansam os socialistas gregos do PASOK.
O Partido Popular tem a vida facilitada: perante as sondagens, qualquer voto que não vá para o PP é um voto a favor do populismo. A estratégia dos populares consiste então num “a favor” do país, do Estado de Direito Democrático, do quadro constitucional e da Europa. O PP tem o seu eleitorado mobilizado e tudo indica que será novamente o partido mais votado. Tal como o Unidos Podemos, os populares também aproveitam a debilidade dos socialistas: acenam o ramo de oliveira e sugerem um governo de coligação. Esta pode ser a única hipótese de sobrevivência do PSOE – o que, no entanto, dificilmente evitará o fim político de Pedro Sánchez.
Já o Ciudadanos combate desde uma posição de equidistância. Foi mais claro do que nunca na recusa a um governo presidido por Rajoy – não votará a favor nem se absterá. Não se trata de um veto ao PP, mas sim ao seu presidente. Albert Rivera e outros altos quadros do Ciudadanos chegaram mesmo a propor putativos substitutos de Mariano Rajoy. Ainda que haja no eleitorado do PP disponibilidade para abdicar do actual líder, quando a sugestão vem de fora o efeito pode ser contraproducente: qualquer militante popular que sugira a mudança de líder será agora visto como membro de uma quinta coluna do Ciudadanos. Para além de continuar implacável na denúncia do populismo do Unidos Podemos, Rivera inovou este fim-de-semana ao abandonar a contemporização com os socialistas do PSOE, acusando-os de cumplicidade com o populismo de Iglesias. De qualquer forma, o Ciudadanos já definiu o preço do seu apoio: a implementação de dez grandes reformas nos primeiros 100 dias de governação.
As sondagens afastam por completo a existência de uma maioria absoluta. E, fazendo fé nas previsões de votos e de mandatos por partido, não se antevêem pactos de governo fáceis. Mas a possibilidade de um governo do Unidos Podemos deverá – ou deveria – desbloquear o impasse. Existem sérios riscos associados à governação da extrema-esquerda - riscos que fui referindo aqui no DELITO - e este fim-de-semana o Podemos ofereceu novos motivos de preocupação: Juan Carlos Monedero, co-fundador e bússola ideológica do Podemos, desferiu um importante golpe contra o princípio de separação de poderes.
Em França, os partidos do centro democrático fizeram um cordão sanitário em redor da Frente Nacional para evitar que o partido de Marine Le Pen saísse vitorioso das eleições locais de Dezembro de 2015. Porventura não seria má ideia se o mesmo sucedesse em Espanha, com Podemos e Izquierda Unida remetidos para um bloco de quarentena.