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Delito de Opinião

A Animação é para crianças (ou não) - 4

João Campos, 13.05.22

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O Homem Duplo
Título original: A Scanner Darkly
Realização e argumento: Richard Linklater
Baseado no romance homónimo de Philip K. Dick (1977)
Produção: Thousand Words, Section Eight, Detour Filmproduction, 2 Arts Entertainment
Ano: 2006
Duração: 100 minutos
País: Estados Unidos

O Homem Duplo será talvez a mais fiel adaptação de Philip K. Dick alguma vez filmada.

E foi filmado mesmo: Richard Linklater usou a técnica de animação rotoscópica para animar as deambulações e peripécias de Keanu Reeves, Winona Ryder, Robert Downey Jr. e Woody Harrelson numa Los Angeles distópica e devastada pelo consumo de drogas. E por uma droga em particular: a Substância D, alucinogénica e viciante como nenhuma outra. De tal forma que o Governo sobe a parada na guerra às drogas, utilizando agentes infiltrados como Bob Arctor/Fred (Reeves) e técnicas de vigilância cada vez mais invasivas.

Qualquer leitor de Philip K. Dick sabe que nas suas histórias nada é aquilo que parece, e ninguém é exactamente quem aparenta ser. O Homem Duplo, o livro, não é excepção - escrevi aqui no Delito sobre ele há muitos anos, quando o li pela primeira vez (dediquei também um parágrafo ao filme). E Linklater cedo percebeu que a vertigem de Arctor/Fred a espiar-se a si mesmo e a comunicar com suspeitos, colegas e chefes através do scramble suit jamais funcionaria tão bem em filmagem convencional como em animação. Reconhecemos Reeves, Ryder, Downey Jr e Harrelson facilmente através da rotoscopia, mas as cores saturadas e as linhas traçadas e esbatidas complementam muito bem a trama ao torná-la progressivamente mais surreal, e geram algumas cenas inesquecíveis. Como as duas alucinações do Charles Freck interpretado por Rory Cochrane, personagem secundária que rouba o filme naqueles dois breves momentos.

Já todos teremos visto adaptações audiovisuais de Philip K. Dick, de Blade Runner a Total Recall ou até à recente antologia televisiva Electric Dreams. Nenhuma, porém, conseguiu capturar tão bem a paranóia e a dissolução da realidade, cerne da obra do escritor, como o Homem Duplo. Não só pela absoluta fidelidade do guião, mas também - sobretudo, diria - pela utilização da animação, que pelas suas características é o formato perfeito para este tipo de histórias. Linklater percebeu-o, e fez um filme espantoso.

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