Saltar para: Posts [1], Pesquisa [2]

Delito de Opinião

Homens e causas fora de moda

Fernando Sousa, 25.01.11

 

Já nem é essa cena (já escrevo como se fala no secundário) do vazio que fica quando morre um homem que deixou obra; é mais por causa desse cancro que é a desmemória, doença dos media comuns que passou também para a blogosfera. Isto por causa da morte de tatic, que quer dizer padre em tzotzil, Samuel Ruiz, o bispo dos direitos indígenas de Chiapas. Quando todos vestiram as suas fardas e pegaram nas suas armas, ele vestiu a sua, a batina, e usou como ninguém a palavra. Quando todos as despiram, ele nem tirou a sua nem deixou de falar. Porque as causas, quando são a sério, não uma moda, sobrevivem ao anonimato e vão até ao fim. Nos anos ainda do PRI, e do dedazo, foi um dos que mais e melhor apontaram a dedo, no México, os barões da ditadura perfeita e da segregação. Pelo menos aqui, no DO, fica lembrado.

Gone too soon

Ana Vidal, 04.01.10

 

 Diz-se que é sempre cedo de mais para se morrer. Mas, por vezes, acontece que a frase não é apenas uma frase feita. Aconteceu hoje, com Lhasa, uma cantora de 37 anos  com uma carreira promissora (e uma vida, certamente) pela frente. Um talento natural para a música, felizmente gravado em 3 álbuns que poderemos ouvir sempre. Muitos outros se lhes seguiriam, tenho a certeza.

 

Edward Kennedy (1932–2009)

João Carvalho, 26.08.09

Edward M. Kennedy morreu hoje, com 77 anos. O mais novo de nove irmãos era senador pelo Estado de Massachusetts e irmão de John F. Kennedy, o presidente assassinado em 1963, e de Robert Kennedy, assassinado em 1968 durante a campanha para a Presidência dos EUA.

Jurista e último patriarca de uma família (tantas vezes designada como clã ou dinastia Kennedy) reconhecidamente dedicada à política e às causas públicas, Edward Kennedy era senador democrata e fez da Saúde e da Educação as suas grandes causas, destacando-se pelo modo como defendia a reforma dos cuidados de saúde. Tal como os irmãos, mereceu sempre o respeito generalizado de correlegionários e adversários. Porém, a vida de bon vivant com alguns escândalos à mistura barrou-lhe a tentativa para chegar à Casa Branca.

Morreu com um cancro no cérebro, diagnosticado no ano passado e depois de ter sido operado há dois meses. Os EUA perderam um dos seus mais influentes políticos e mais antigos senadores.

Walter Cronkite (1916-2009)

Pedro Correia, 18.07.09

 

Chegou a ser o homem mais influente dos Estados Unidos - não pode haver mais invejável título de glória para um jornalista. E Walter Cronkite era um jornalista a cem por cento. Fez de tudo na profissão, esteve em todos os momentos decisivos da história que lhe coube em sorte testemunhar. Foi repórter na II Guerra Mundial, acompanhou o Dia D, cobriu os julgamentos de Nuremberga, chefiou a delegação da CBS em Moscovo no tempo da Guerra Fria, regressou à reportagem de guerra no Vietname, relatou a histórica emissão da conquista da Lua há exactamente 40 anos, acompanhou de perto o caso Watergate. Foi o grande responsável pela progressiva, constante e regular subida de audiências da CBS, que no final da década de 60 se tornou no canal televisivo com mais espectadores nos Estados Unidos devido a uma palavra-chave: credibilidade.

De facto, entre todos os atributos que revelou, talvez o maior fosse este: Cronkite era credível. O termo anchorman, hoje tão popularizado, foi criado para ele, graças ao seu brilhante desempenho na cobertura jornalística das convenções democrata e republicana de 1952 - as primeiras integralmente acompanhadas pelas câmaras televisivas. Em 1962, tornou-se o pivô do principal telediário norte-americano, o CBS Evening News: abandonou estas funções quando completou 65 anos, em Novembro de 1981 - e viria mais tarde a confessar ter sido este o maior erro da sua vida profissional. Tinha fôlego, energia e vontade para muitos anos mais defronte do ecrã.

Na memória de muitos estão ainda as severas críticas que fez ao envolvimento de Washington no Vietname: foi lá como repórter, em 1967, e o que viu convenceu-o de que os americanos estavam a travar a guerra errada no local errado. Não hesitou em dizer o que pensava perante o seu auditório de dezenas de milhões de espectadores. Ao escutá-lo, o então presidente Lyndon Johnson comentou perante os seus assessores: "Acabamos de perder o apoio da América profunda." Meses depois, em Março de 1968, Johnson desistiria da recandidatura à Casa Branca: ninguém teve dúvidas de que as críticas de Cronkite tiveram um papel fundamental nesta decisão.

A única vez em que esteve quase a perder a voz, embargada pela comoção, foi ao princípio da tarde de 22 de Novembro de 1963, ao conduzir a emissão especial da CBS sobre o atentado ao presidente John Fitzgerald Kennedy. Viveram-se minutos de incerteza, enquanto o inquilino da Casa Branca, alvejado em Dallas, era conduzido de urgência ao hospital. Quando o óbito se confirmou, coube a Cronkite revelar aos atónitos americanos a notícia em que ninguém queria acreditar: fê-lo com o profissionalismo e o rigor de sempre. Mas também com aquela nota de genuína emoção que nunca está arredada do melhor jornalismo.

Walter Leland Cronkite tornou-se, ainda em actividade, uma lenda viva do jornalismo. Acaba de morrer, aos 92 anos. Mas continuará a ser uma figura modelar para todos os profissionais da informação, nos mais diversos quadrantes. Como referência de credibilidade, o maior dos atributos que um jornalista pode ter.

Vasco Gervásio [1943-2009]

André Couto, 04.07.09

Ao longo da nossa vida há pessoas que nos marcam pela lição que são, pelo seu exemplo. O Vasco é uma das que me marcaram. Tive a sorte de o conhecer desde sempre, de receber dele lições que nunca esquecerei, de ouvir histórias impagáveis, daquelas que deixam roídos do inveja os miúdos quando olham para os heróis. O Vasco era um herói para mim, um exemplo de fair-play, alegria e solidariedade desinteressada. Custa muito. Coimbra perde sem dúvida encanto e alegria, nunca mais será igual. 

Perdemos o Vasco ontem à noite, mas ele sabe bem que é daqueles que não vão, que ficam para sempre, bem junto de quem o conheceu.

Até amanhã, Vasco!

 

(Breve biografia feita pelo Público e outra pelo nosso leitor António P.)

(também no CC)

Alfredo Farinha [1925-2009]

André Couto, 28.03.09

Vi agora, apenas agora, que faleceu o Alfredo Farinha.

Cresci a vê-lo na televisão a defender o meu Benfica. Ganhei enquanto criança espírito crítico com futebol a ler os seus textos, quando ainda tinha a ingenuidade de miúdo e ia todos os dias de manhã comprar A Bola à banca do Sr. Fausto.

Não me esqueço daquela forma espontânea e inabalável como defendia o Benfica. Parecia que lhe saíam o coração e o estômago pela boca cada vez que atacavam o Nosso Glorioso. Era assertivo e impunha um respeito único, jamais visto em defensores do Benfica em programas do género. Eram tempos difíceis, acumulavam-se os anos em que o título nos fugia, mas nem por isso o Alfredo desistia.

Sei que antes de tudo isto, antes de o Alfredo se afastar, muito deu ao mundo do futebol.

Ao Alfredo Farinha deixo o meu muito obrigado e a certeza de que a sua memória perdurará.

E Pluribus Unum!

 

[Adenda] Contributo do Pedro Correia:

O Alfredo Farinha era o penúltimo representante ainda vivo da melhor geração de jornalistas da imprensa desportiva portuguesa. Uma geração que transformou o jornal 'A Bola' num cartão de visita de Portugal em todos os continentes. Gente que escrevia bem, que tinha convicções e que não receava exprimir opiniões, não confundindo o confronto de ideias com ataques de carácter. Uma geração que incluía Vítor Santos, Carlos Miranda, Carlos Pinhão, Homero Serpa e Aurélio Márcio (este o único sobrevivente).
Li, desde miúdo, incontáveis textos do Alfredo Farinha, ainda naqueles velhos lençóis d'"A Bola". Presto aqui a minha homenagem, como leitor, à memória desse veterano jornalista.