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Delito de Opinião

O esbulho fiscal dos salários

Paulo Sousa, 13.08.20

É vulgar e fácil de concluir que os salários em Portugal são demasiado baixos.

Não me quero meter na lavra dos economistas e começar para aqui debitar tiradas sobre rendimento real ou nominal e sobre ganhos de produtividade. Propus-me apenas a observar, de forma muito simplista, alguns dados que sendo públicos quis o governo que fossem ocultados. Para isso recorri ao simulador de salários líquidos para o ano de 2020 do site doutorfinancas.pt.

Como é práctica corrente, e fazendo tábua rasa do significado da expressão “subsidio de refeição”, considerei que o valor creditado no cartão refeição é também um rendimento. Não considerei o subsídio de férias nem de natal.

Tendo em mente os jovens da geração mais bem preparada de sempre e a sua capacidade em se tornarem financeiramente independentes escolhi os dados que lhe fossem adequados e por isso os cenários que simulei referem-se a um sujeito não casado e sem dependentes.

O primeiro cenário respeita a um jovem recém-formado que tenha negociado com a sua entidade patronal um salário de 1.000€ líquidos.

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O valor do salário base indicado foi definido por tentativas de forma a encontrar o salário liquido pretendido. Neste caso 1, em que o empregado recebe 1.000€ líquidos, o seu patrão tem um custo de 1.531€ e por isso podemos afirmar que este jovem apenas recebe uma parcela de 65%  do custo suportado pela empresa.

Consideremos agora que o empregador está muito satisfeito com o desempenho deste jovem ao ponto de o querer aumentar. Nesse caso (cenário 2) para um aumento líquido de 100€ o empregador terá de gastar mais 208€. O valor final auferido é assim reduzido para 63% da totalidade do custo salarial da empresa.

Se imaginarmos que este jovem é um engenheiro informático que foi contratado por uma startup criativa de capitais irlandeses que por cá assentou arraiais na vaga do Web Summit, então as suas referências salariais são outras. Considerando que o SMN Irlandês é de 1.656€, a empresa oferece a este jovem engenheiro 2.000€ líquidos. Assim teremos:

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Neste caso o jovem engenheiro irá receber apenas 52% do custo suportado pela empresa que quis investir no nosso mercado. O Estado retém 48% do valor que a startup desembolsa.

Para quem possa pensar que esta dimensão do valor retido pelo estado respeita apenas a altos (?) ordenados veja então o casos do nosso SMN.

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Este caso 4 respeita ao SMN e o caso 5 a um salário líquido de SMN+100€. Mesmo nestes casos de salários baixos o estado retém no mínimo 23% para logo imediatamente a seguir, pela fartura de mais 100€ passar a reter 31%.

A segurança social paga pelo empregador, não consta no recibo de ordenado por opção política. O discurso anti-capitalista é uma marca cultural do regime fundado pela constituição socialista de 1976. Ora, se o empregado não tiver conhecimento de quanto efectivamente custa à empresa onde trabalha será mais fácil alinhar numa atitude anti-patronato, e isso agrada ao mainstreem socialista. A IL propôs em novembro do ano passado que esta informação passasse a ser dada ao empregado, mas essa proposta não passou no Parlamento.

Acrescento ainda que estes valores aqui apresentados não incluem a totalidade dos custos obrigatórios e igualmente suportados pela empresa empregadora, como sendo formação, seguros de acidentes de trabalho, segurança e higiene no trabalho e equipamento de segurança. E haverão outros, que me escaparam.

Perante estes dados, uma infinidade de diferentes interpretações podem ser feitas. Cada um de nós terá a sua que aqui pode partilhar. Eu, em breve aqui regressarei com a minha.

IPO

José Meireles Graça, 24.06.20

Tenho na garagem um charêlo com mais de 20 anos, que não se vende por razões sentimentais das autoridades domésticas e porque, de longe em longe, dá jeito.

Um luxo: levando em conta o custo do seguro, imposto de circulação (na realidade um imposto sobre a propriedade) e inspecção periódica mais valia alugar um carro quando fosse necessário.

Há uns anos o pagamento do IUC passou a fazer-se no aniversário do registo do automóvel, uma habilidosa mudança legislativa dos patifes que enxundiam a AT, contando que muitos condutores se esqueçam - se se esquecem do aniversário das consortes, por que raio haveriam de se lembrar do da porcaria do carro. A GNR, na realidade, para efeitos do trânsito automóvel, uma polícia fiscal, aplica multas terroristas em caso de esquecimento ou falta de dinheiro – este imposto e as multas respectivas castigam muitas vezes não a distracção mas a pobreza.

Multas gravosas são também devidas no caso da falta do abençoado selo da inspecção periódica. E por isso na semana passada levei o coche a um desses centros onde se fingem análises rigorosas e desisti porque havia aí uns 20 carros à frente; e a mesma coisa noutro da cidade que tem a honra de me contar nos seus naturais.

Ontem, porém, foi o dia. Esperei aí apenas umas duas horas debaixo de um sol abrasador e, quando chegou a minha vez, e porque o “perito” era novo, lá veio o diálogo surreal:

Abra o capot, por favor.

Para que efeito?

Preciso de pôr uns cabos no motor.

O motor não é à frente.

Então abra atrás.

Posso abrir (saindo do automóvel porque a tampa da mala só abre com a chave da ignição) mas por lá também não tem acesso ao motor, que é central.

Ah, e como vou fazer para ter acesso ao motor?

Não faço ideia, creio que por baixo, pondo o carro no elevador.

 

O homem resolveu o problema a contento, depois de obrigar a um tempo interminável com o motor às 3.000 RPM e gastando ainda mais com várias jigajogas para testar a suspensão e os travões.

Gosto destas partes gagas. E como não posso, como desejaria, enfiar uma carga de lenha no legislador que pariu estes inferninhos, faço parte daquela minoria de cidadãos impliquentos que têm, por funcionários, um respeito menos do que obsequioso, e pelas autoridades um escasso quanto baste.

Porque, sejamos claros, aqueles condutores que, debaixo de um sol escaldante, aguardam pacientemente que se lhes verifiquem os carros a troco de mais de trinta euros (o valor tem quebrados com cêntimos para dar a impressão que resulta de um qualquer cálculo científico e não de puro arbítrio; e porque a ideia de que um serviço público deve ter em conta a comodidade do público não cabe na cabeça de nenhum funcionário, e menos ainda na de um secretário de Estado qualquer com pressa de ir ao próximo workshop sobre o simplex) acreditam provavelmente que o que estão ali a fazer tem a ver com segurança rodoviária.

Mas não tem. Ninguém tem um carro a cair de podre se o puder ter em bom estado; ninguém circula com um carro com a direcção desalinhada, ou os travões em mau estado, ou os pneus gastos, se tiver meios para o reparar; ninguém, constatando que o veículo gasta anormalmente, deixará de o tentar corrigir; e, sobretudo, não faltam defeitos graves que um veículo pode ter, e que não são detectáveis pelos procedimentos normais de inspecção, como a Deco (uma organização socialista que, para resolver qualquer problema, reclama sempre mais funcionários e legislação) descobriu aqui há uns anos.

Investiram-se milhões para criar estes centros de parlapatice rodoviária; criou-se um corpo nacional de funcionários especializados em não fazer absolutamente nada de útil, enquanto há oficinas que têm dificuldade em recrutar mecânicos; deixou-se nascer um grupo de interesses que, à boleia da segurança rodoviária, torna impossível qualquer reforma que o prejudique; queimam-se milhares de horas de trabalho de pessoas que têm realmente que fazer e estão de guarda aos seus veículos, à espera de vez; e mobilizam-se armadas de burocratas que vão expelindo legislação, desde que em Dezembro de 1999 se transpuseram para o direito interno as elucubrações de uns anónimos do Conselho Europeu ou da Comissão (mais de meia dúzia de decretos-lei, desde então, e um número indeterminado de circulares e instruções de iluminados).

E então, a inspecção não serve mesmo para nada?

Serve:

Para a polícia se dispensar de verificar o estado do piso dos pneus (estes têm, actualmente, uns travessões que indicam o grau de usura), ou qualquer outra coisa, e perderem tempo a ver o bendito selo, no afã de passar a multazinha;

Para detectar desconformidades que nada têm a ver com segurança: há uns anos tive de substituir uma placa de matrícula porque a parte amarela estava desmaiada pelo sol (o mesmo amarelo com o mês e ano de registo que um legislador azeiteiro lisboeta achou que era indispensável figurar e agora um seu colega, com melhor gosto e possivelmente sem interesses em stands de automóveis, acha dispensável no modelo mais recente da mesma placa).

Para justificar multas, defesas, incumprimentos, ocupação dos tribunais com trivialidades, penhoras, e receita fiscal.

E de segurança, nada? Ora bem, o tal charêlo tem, há mais de uma dúzia de anos, o tensor do cinto de segurança do condutor avariado. Isto significa que o cinto não está lá a fazer nada, estando mais lasso do que as contas públicas. A Deco, se consultada, diria decerto que era preciso rever as normas, a ver se se consegue aumentar a lista de procedimentos até se perder não duas horas mas um dia, e pagar não um pouco mais de 30 euros mas meio salário mínimo. Pois bem, o cinto nunca ninguém viu. Ainda bem, desmontar aquela cangalhada seria um grande nó cego – o carro foi concebido por uns ingleses que já faliram, tem partes de ciência oculta.

Nunca ninguém viu que o cinto não funciona e quase ninguém vê os absurdos burocráticos que o moderno estado mete-se-em-tudo põe na vida das pessoas.

O carro, para a idade, não anda mal. E nós poderíamos andar melhor se víssemos os defeitos onde eles estão. Mas é como o cinto, está onde deve estar porque é obrigatório. Se funciona ou não – isso não interessa nada.

Espuma legislativa

José Meireles Graça, 21.04.20

A especulação nos preços pode suceder, como é geralmente sabido, quando para um determinado produto a procura é muito maior do que a oferta.

O combate a tal prática costuma agravar a escassez e, a prazo, desembocar num mercado negro, por razões que não me vou dar ao trabalho de alinhar – a literatura sobre isso é imensa, quem tiver muita curiosidade e pouco senso que procure por “price gouging”.

Os governos socialistas, de mais ou menos carregada pinta, por considerarem que os produtores e comerciantes são, salvo prova em contrário, exploradores, e que o mercado é de tal modo imperfeito que a golpes de leis, regulamentos, polícias e sanções, cumpre muito melhor a sua função, não têm pejo em recorrer à prática de intervenções sortidas.

Os resultados são invariavelmente desastrosos, como se vê na Venezuela, onde até o petróleo escasseia, mas aquele triste país não é o melhor exemplo de práticas socialistas: o melhor exemplo ainda há de aparecer porque aquela abençoada doutrina nunca é avaliada pelos resultados, mas pelas intenções.

Entre nós, o caso está longe de ter aqueles graves contornos – fora mister, para tanto, que frei Anacleto encabeçasse um governo, com Pais Mamede, por exemplo, no ministério das Finanças, e a estimável Catarina nos Assuntos Sociais. Para o da Administração Interna qualquer um serviria porque seria sempre um progresso, e para os Negócios Estrangeiros haveria vários candidatos, desde que fizessem a barba e tomassem banho.

Mas nem por isso deixamos de ter controle de preços. Que obscenas fortunas se estariam por aí à sorrelfa a acumular à pala da venda de dispositivos médicos e de equipamentos de proteção individual, álcool etílico, gel desinfectante cutâneo de base alcoólica, e, no caso do gás, de banhos e grelhados mal feitos, não me foi possível apurar. Nem interessa muito: nem o controle de preços é para durar nem tem verdadeiramente outro propósito senão convencer o eleitorado do desvelo das autoridades – nem Costa nem Siza Vieira são venezuelanos.

Convencer com sucesso. Parece que a popularidade dos drs. Costa e Rio subiu recentemente, o que diz alguma coisa sobre as razões do relativo atraso português: quando me vierem falar da superior lucidez e fortaleza de espírito dos portugueses, que são traídos pela mediocridade das elites e outros pé-ré-pé-pés nesta onda, só não mando os interlocutores passear porque muitos deles pertencerão à nova vaga de emigrantes que serão forçados a dar à sola do país que, economicamente exangue, sobre-reagiu à Covid enterrando ainda mais a sua economia, sob pressão de uma opinião pública aterrorizada.

Para já, parece estar tudo bem: os funcionários públicos que trabalham não perderam nada; os que não trabalham também não, e uns e outros até foram recentemente aumentados; e os trabalhadores em lay-off poupam em comida e transportes parte do corte que tiveram. Quanto aos desempregados acreditam que, quando a crise passar, vão ter emprego. Mas de toda a maneira não têm voz porque os sindicatos só falam neles como categoria abstracta de pessoas que, se o país fosse comunista, teriam emprego, isto enquanto fazem reivindicações irrealistas para os seus filiados e conservam os privilégios dos dirigentes.

Donde este controlezinho de preços nem tem importância nem consequências. Mas mesmo assim fui ver e fiquei varado porque julguei que as notícias que falavam de limitações de 15% na margem de lucro eram simplificações de jornalistas analfabetos, mas não. O Despacho diz, expressamente: A percentagem de lucro na comercialização, por grosso e a retalho, de etc. etc. identificados no anexo ao Decreto-Lei etc. etc., bem como de etc. etc., é limitada ao máximo de 15 %.

O que raio é percentagem de lucro? A que incide sobre o total dos custos, isto é, consumo, fornecimentos e serviços de terceiros, despesas financeiras, salários, depreciações, outros custos? Bem, se for isso (e deve ser, que é a acepção mais vulgar e mesmo assim incorrecta) qual o custo a considerar? Porque há custos fixos e variáveis (dependendo estes últimos do nível de actividade) e portanto dificilmente a mesma empresa terá, em anos ou até meses sucessivos, exactamente a mesma estrutura de custos, para não falar de variações nos preços de venda ou ganhos de eficiência. É certo que legalmente todos os custos devem ser imputados a todos os produtos, mas quando? A estrutura do último ano, a do último trimestre, a do último mês, o quê?

Em suma, vão-se levantar autos porque provavelmente os critérios serão administrativamente fixados, em circulares obscuras que os funcionários interpretarão como se tivessem eficácia externa, uma confusão que os serviços estão habituados a fazer e que em devido tempo entupirá ainda mais os tribunais, com o inerente imprevisibilidade que implica a aplicação de leis feitas com o joelho.

Ao menos no que toca às garrafas de gás a lei é clara: fixam-se os preços de venda e pronto. Mas mesmo aqui o legislador (que é a palavra tecnicamente adequada e púdica para descrever uns funcionários soturnos que põem debaixo do nariz dos governantes, apressados para a próxima conferência de imprensa onde se vão aliviar de propaganda, umas moxinifadas legais) não resistiu: na fórmula para cálculo do preço faz-se incidir o IVA sobre o spread  e o ISP.

Ou seja, o IVA incide sobre outro imposto, como aliás já acontecia neste caso e continua a acontecer noutros.

Imagino o funcionário que redigiu o pastelão a roer as unhas de satisfação: a administração pública portuguesa dá provas de grande competência e amor à independência falando estrangeiro e ignorando o que sobre a matéria (impostos sobre impostos) acha a EU.

E o ministro, se aos seus ouvidos apenas abertos aos murmúrios lisonjeiros dos áulicos chegassem as críticas que uma imprensa obsequiosa não faz, diria: ora, isto é para durar um mês, qualquer coisa serve, e a verdade é que a gente está mortinha por aliviar estas tolices, logo que a opinião pública, apavorada com a doença, comece a ficar apavorada com a miséria.

Antes falidos que competitivos

Paulo Sousa, 27.01.20

Segundo dados das Finanças, cerca de 30.000 residentes beneficiam do regime de Residentes Não Habituais o que na prática equivale a estarem isentos de IRS. Incluem-se neste regime principalmente reformados de Estados Membros da UE, nomeadamente Finlândia, Suécia e França, assim como emigrantes portugueses que regressaram à pátria.

Esta situação tem causado algum incómodo aos países de origem pelo facto deste regime ser fiscalmente compensador para quem decide passar a reforma em Portugal, verificando-se assim uma perda de receita fiscal considerável por parte dos seus países de origem.

Podemos dizer que o clima ameno e a amabilidade dos portugueses ajuda neste processo, mas no fim de contas estamos a falar apenas do que será o único aspecto em que se pode dizer que o nosso enquadramento fiscal é competitivo. É como se estivessemos para os reformados estrangeiros como a Irlanda e a Holanda estão para as empresas.

Tudo isto tornou-se novamente assunto porque o governo pretende agora passar a cobrar 10% de IRS nestes casos. Não faltará quem aplauda tal medida. Se um português ganhasse o que ganha a classe média baixa na Escandinávia teria de pagar 40% de IRS, porque é que raio eles deverão estar isentos?

Há no entanto algo que convém não esquecer. A isenção fiscal destes reformados restringe-se ao IRS. Como têm casa - pagam IMI – almoçam, jantam, consomem electricidade e fazem compras - pagam IVA - têm veículo(s) próprio(s) - pagam IA e IVA sobre o IA, e IUC - deslocam-se pelo país - pagam IPP – e por aí a fora.

Isentos desta imensidão de impostos, taxas e taxinhas estão apenas os reformados escandinavos que não vivem em Portugal.

O governo podia apostar na divulgação noutros países onde a nossa fiscalidade é competitiva – esta verdadeira avis rara fiscal – mas os socialistas preferem descobrir, por tentativas, qual o ponto de equilíbrio destes contribuintes. Como sempre acontece nestas coisas, após os 10% iniciais outros aumentos se seguirão até chegaremos ao ponto em que haverá quem perca a paciência e mude para outras paragens, ficando então efectivamente isento de impostos portugueses.

A revolta dos coletes amarelos.

Luís Menezes Leitão, 17.11.18

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O actual Estado fiscal insuportável, depois de ter elevado os impostos directos quase até ao limite do absurdo, aposta agora nos impostos indirectos e na multiplicação de taxas por tudo e por nada, como se viu com a protecção civil, a que agora o governo quer regressar. Só que há alturas em que esta situação conduz a movimentos de revolta de cidadãos, como entre nós sucedeu com a revolta da ponte sobre o tejo em 1994, que precipitou o fim de Cavaco Silva. Hoje parece que é Emmanuel Macron que está a passar pela mesma situação.

Indignação aposentada

Pedro Correia, 01.06.18

Os profissionais da indignação estão todos aposentados.

Se não estão, parecem.

Não se detecta sinais deles no país com maior carga fiscal em 22 anos, e que paga a terceira factura europeia mais pesada em gasolina - mesmo antes de impostos - e a electricidade mais cara da Europa por custo de vida.

Esperava deles ao menos um gritinho. Afinal permanecem todos em silêncio: esgotaram os decibéis no anterior ciclo político.

Vai levar a palma ao Saraiva

Sérgio de Almeida Correia, 28.02.17

"Basta o residente não ser “habitual”, isto é, ser estrangeiro ou ter regressado de uma estadia de mais de cinco anos fora do país, para Portugal ser um domicílio fiscal muito agradável. No portal das finanças, está confessado o objectivo de “atrair beneficiários de pensões obtidas no estrangeiro”. Resultou no caso da Suécia, donde as partidas para Portugal terão triplicado entre 2011 e 2014."

 

Se António Costa tivesse alterado o regime teria feito mal porque Portugal precisava dessas receitas. Como até agora ainda não o alterou, António Costa faz mal na mesma. É lógico, de acordo com a irrepreensível lógica do historiador Rui Ramos.

Apenas lamento que Rui Ramos não tivesse perguntado na altura, isto é, no tempo do governo da coligação PSD/CDS-PP, quando essas partidas da Suécia para Portugal ajudaram a compor as contas de Vítor Gaspar e de Maria Luís Albuquerque (e ainda assim foram insuficientes para atingirem um défice de acordo com as exigências de Bruxelas), se também então podíamos ser suecos.

É que se o Governo de Passos Coelho (o das ajudas de custo e despesas de representação), do "Dr." Relvas (o da licenciatura a jacto) e do Dr. Macedo (o dos vistos gold) me tivesse permitido, nessa altura, ser sueco, talvez hoje, a milhares de quilómetros, não me sentisse tão português e tão parecido com os gregos de cada vez que transfiro dinheiro para pagar as contribuições da minha futura reforma.

 

De facto inaceitável.

Luís Menezes Leitão, 24.02.17

Dou inteira razão à Ministra sueca. É de facto inaceitável que um país se proponha isentar reformados estrangeiros de imposto sobre as pensões ao mesmo tempo que sangra os seus nacionais com taxas de imposto sobre o rendimento expropriatórias e, não contente com isso, ainda vem a seguir lançar mais impostos sobre o património que os desgraçados ainda conseguiram poupar, apesar da sangria fiscal sobre o seu rendimento. Se os reformados suecos estão cá a residir, e beneficiam dos nossos serviços públicos, então que paguem impostos como toda a gente. Basta o que basta!

Mais um caso para o Poirot

Sérgio de Almeida Correia, 23.02.17

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O ex-secretário de Estado dos Assuntos Fiscais desconhece de que assunto se trata. Eu também. Os inspectores tributários querem ver esclarecido o destino de 10 mil milhões de euros. Eu também. O Ministério das Finanças e os partidos, através dos seus deputados no parlamento, querem saber o que se passou. Eu também.

Entretanto, "[h]á oito meses que estão a marinar no Parlamento várias propostas para combater a “criminalidade económica, financeira e fiscal”". Só há oito meses?

Longe de Portugal, perdido como já estou no meio de tantas "reformas" do Estado, da Administração Pública e de tudo e mais alguma coisa, creio que a pessoa ideal para esclarecer o que aconteceu aos milhões, e todos os outros mistérios que assolam o nosso país, é o meu velho amigo Hercule Poirot. É tipo para fazer um trabalho limpinho. Não cobra honorários, desconhece o que são horas extraordinárias ou subsídios, não é funcionário do Estado, não depende de nenhum partido, não pede emprestado aos amigos, nunca foi ao BES, não conhece ninguém na CGD, e ainda confidenciou-me que não faz tenções de se reformar. 

Para já, é uma sorte que se saiba quem são os beneficiários do subsídio de lavagem. Desta parte está o Poirot livre. Mas, pelo sim, pelo não, o melhor é que ele também investigue se todos os que recebem o subsídio tinham um carro para lavar. Ainda me lembro de em tempos haver uns figurões que recebiam um subsídio de residência, por estarem deslocados em Lisboa, tendo casa própria na capital. E houve um que até foi a correr mudar a residência para o Algarve para passar a receber o subsídio.

Em Portugal, nestas coisas das lavagens, seja dos carros ou dos milhões, sabe-se sempre quem paga e quem fica sem os milhões, tal como nos subsídios. Mas nunca se sabe muito bem quem lava o quê e a quem. Nem com que mão.

Reflexão do dia

Pedro Correia, 21.10.16

«O miúdo que poupa uma moeda para beber um pirolito paga o novo imposto. Já o alcoólico milionário que abre, logo de manhã, a terceira garrafa de tintol da Herdade das Servas Colheita Seleccionada Balthazar 2011 (a 395,50 euros cada uma) não paga imposto nenhum. Isto é, só paga caso se lembre de misturar o vinho com uma gasosa.»

Miguel Esteves Cardoso, no Público

Like a rolling stone

Pedro Correia, 14.10.16

Prestemos tributo

Rui Rocha, 13.10.16

Reconheça-se à Geringonça, em todo o caso, o mérito de ser absolutamente coerente com os seus propósitos. Não só está a lançar medidas verdadeiramente do lado da receita, nomeadamente quando a receita tem açúcar, como está a passar de um modelo que privilegia os impostos directos para um outro assente em tributar com sumo.

Perdão?

José António Abreu, 06.10.16

Em 2013, em tempos que ninguém negava serem de crise, o PS criticava os perdões fiscais. Hoje, em tempos que era suposto serem de crescimento e desafogo, com (dizem-nos) as contas públicas perfeitamente controladas, o governo do PS institui perdões fiscais. A ironia é grande mas, por baixo dos sorrisos amplos e das tiradas plenas de certezas, a angústia deve ainda ser maior.

Fat tax (2)

Rui Rocha, 05.10.16

É óbvio que a fat tax tem como preocupação tudo menos a saúde dos contribuintes. Se o propósito real do governo fosse o de promover uma vida mais saudável, em vez de lançar impostos fazia como nos maços do tabaco: pacotes de donuts com fotografias chocantes do perímetro abdominal do Costa ou do Rocha Andrade.

Fat tax

Rui Rocha, 05.10.16

Primeiro taxaram o tabaco, mas como tu não fumavas, não te importaste. Depois taxaram o sal e o açúcar, mas como tu só comias alimentos saudáveis, não te importaste. Então eles decidiram taxar a tua quinoa e as tuas sementes de chia e já era tarde de mais.

Aquele cujo nome não pode ser pronunciado!

Luís Menezes Leitão, 04.10.16

"Portugal não precisa de ajuda externa!", declarou José Sócrates em Março de 2011. Pouco mais de um mês depois, estava a pedi-la. Agora o Governo, depois de ter distribuído dinheiro a rodos pelas suas clientelas políticas, quer convencer os portugueses de que não precisa de um novo resgate e que o dinheiro vai chegar, se calhar por forma semelhante ao milagre da multiplicação dos pães. Mas na Europa Portugal já voltou a cair no radar e o comissário Oettinger foi muito claro nos seus avisos: os países do Norte não estão dispostos a continuar a sustentar o despesismo e a irresponsabilidade dos países do Sul e, se Portugal cair, vai ser muito difícil alguém o resgatar. Mas, apesar disso o governo acha que deve continuar a fazer livremente as suas piruetas na corda bamba e o Ministro dos Negócios Estrangeiros lá mandou calar o comissário. O novo resgate tornou-se aquele cujo nome não pode ser pronunciado.

 

E, no entanto, ele move-se. Agora é a UTAO a garantir que são totalmente inverosímeis as previsões da receita fiscal constantes do Orçamento. O governo, porém, acha que vai resolver o problema tributando não apenas tudo o que mexe, mas também tudo o que está quieto. Depois do aumento do imposto sobre os combustíveis, do imposto sobre o sol e as vistas, do novo imposto sobre o património, da tributação do alojamento a turistas, lembrou-se agora de tributar a comida com sal e açúcar. Se tivesse um mínimo de informação, saberia que esse imposto foi o descalabro total na Dinamarca, quando foi lançado, só tendo durado um ano. Os dinamarqueses passaram a abastecer-se destes produtos na Alemanha, já que o seu preço na Dinamarca disparou, e milhares de empregos na Dinamarca foram perdidos. Com uma experiência tão boa, não admira que estas alminhas que nos governam por obra e graça da geringonça, queiram repetir a receita em Portugal. Parece não ter sido suficiente a experiência dos postos de combustível falidos nas fronteiras, a benefício dos espanhóis.

 

O governo vive num mundo irreal, lançando com desespero todo o dia novos impostos, cada um mais absurdo que o anterior. E nem se dá ao trabalho de reparar na figura que está a fazer lá fora, apesar dos avisos bem intencionados que recebe. Mas é evidente que a sua herança vai ser um país esmagado por impostos e falido. Mais inteligente foi o PSOE espanhol que se recusou a ir atrás de cantos de sereia.

Um tiro de pólvora seca

Pedro Correia, 28.09.16

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Parece cada vez mais óbvio que a polémica em torno do novo imposto sobre o património imobiliário anunciado pela deputada bloquista Mariana Mortágua foi um tiro de pólvora seca, precipitado pela preocupação do BE em antecipar-se ao PCP no preenchimento da agenda mediática. António Costa esvaziou-a na primeira oportunidade e dela resulta apenas uma espécie de marcação de território ideológico com matriz identitária – algo que só interessa aos parceiros menores da actual maioria parlamentar.

“Combater os ricos” - caricaturados na propaganda clássica como obesos de cartola, prontos a ceder aos pobres apenas as cinzas dos seus charutos - é uma bandeira da esquerda pura e dura que o PS nunca partilhou.

Há excelentes motivos para o primeiro-ministro se demarcar do debate ideológico em curso, passatempo que nunca seduziu este "moderado social-democrata”, como ele próprio se intitula. Os sinais que as inflamadas declarações de Mariana Mortágua num evento socialista transmitiu à sociedade portuguesa, tão carente de recursos financeiros, são errados. Por demoverem as poupanças, desmobilizarem as aplicações dessas poupanças na economia real e desencorajarem o investimento de que a nossa economia tanto carece em tempo de estagnação.

De resto, “acabar com os ricos" sob o pretexto de que é preciso acabar com os pobres constitui uma mistificação grosseira: nunca pobre algum enriqueceu a partir do empobrecimento de um rico, como as chamadas “revoluções proletárias” do século XX amplamente demonstraram. Eis a maior vantagem do conhecimento histórico: evitar que se repitam trágicos erros do passado.