Diário irregular
15 de Março
Artigo de Mário Soares no DN. Tanto barulho para nada. Soares não gosta de Sócrates. De Cavaco já se sabia. Quando assim é tudo se torna mais fácil e cómodo para o velho patriarca. Tem razão num ponto: quando diz que José Sócrates não tem informado pedagogicamente os portugueses e que tem cometido erros graves. Faltou dizer que o maior desses erros foi tê-lo apoiado nas presidenciais de 2006. Cavaco não teria sido eleito à primeira volta. Provavelmente nem sequer teria sido eleito. O País não estaria hoje como está. Esquecimentos.
Com sentido de oportunidade, faro jornalístico, e sem público a estorvar, Fátima Campos Ferreira conseguiu ontem, ao fim de múltiplas tentativas, realizar um “Prós e Contras”. As crises, todas elas, permitem lançar alguma areia, distrair os menos atentos, mas dificilmente escondem os piores. O triunvirato que dirige o PSD – Passos Coelho, Miguel Relvas e Miguel Macedo – revela-se em cada intervenção. A indigência a que o partido chegou é tal – em termos políticos – que os principais porta-vozes são hoje os ex-líderes Luís Filipe Menezes, Santana Lopes e Marques Mendes, aos quais só faltou serem corridos a pontapé pelos seus correligionários. À esquerda, as alternativas estão fechadas. À direita são inexistentes. O PCP fala uma linguagem crua apenas compreensível pelos reformados da Intersindical ou pelos fundadores da Lisnave. O Bloco de Esquerda recupera do ataque do escaravelho da palmeira e revela um interior esponjoso. O CDS engoliu a cartilha demagogo-populista. Encheu-se de jovens que circulam pelos canais de televisão sem outro objectivo que não seja fazerem-se ouvir. Assunção Cristas é uma das raras excepções em matéria de bom senso e equilíbrio quando chamada a intervir naquela creche em que o partido se tornou, mas ela só não chega para formar um governo de salvação nacional.
As instalações estão mais acanhadas e exíguas do que antes. Pelo menos para os utentes. Meia hora antes da abertura já uma longa fila se formou. Lá dentro, a gente amontoa-se de senha na mão. A simples emissão de uma guia e o seu pagamento leva horas. Foi assim ontem. Hoje repetiu-se a cena. É recorrente. Como é possível falar em produtividade na Administração Pública quando o simples pagamento de um IMT leva horas? Não será mais barato e útil ao País ter um sistema informático decente ou admitir a emissão manual de guias quando o sistema falha, em vez de ter os funcionários parados e os utentes à espera horas a fio? Se não há sistema conversa-se. Vá tomar um cafezinho e volte daqui a um quarto de hora. Já cá está? Continuamos sem sistema. Já tivemos mas, olhe, voltou a cair. Quando quis imprimir foi-se de novo abaixo. É melhor passar logo à tarde. Venha à abertura que depois pode cair. O melhor é não voltar, penso eu. Mudar de vida. Não será hoje.
Esta Primavera as cerejeiras não terão cor. Não consigo deixar de pensar no Japão e na tragédia que sobre o seu povo se abateu. É impossível esconder. As lágrimas secam quando o mar recua. O sofrimento sem lágrimas é sempre mais doloroso.
Foi anunciado um acordo com os camionistas para pôr termo às pedradas e à coacção dos piquetes. Não sei porquê, o ministro dos Transportes fez-me lembrar a ministra da Educação. Ele fala em utilização de outros combustíveis como a ministra falava em rigor na avaliação dos professores. Em que estaria ele a pensar? Nas horas extraordinárias.
Ana Lourenço continua a conduzir excelentes monólogos. Esta noite calhou a vez a José Sócrates. Uma entrevistadora reverente, que se evapora perante os entrevistados, desqualifica-se como jornalista. E deixa a cidadania mais pobre.