Saltar para: Posts [1], Pesquisa [2]

Delito de Opinião

Chamam-lhe informação...

José António Abreu, 22.02.15

Há pouco mais de uma hora, no Jornal da Tarde, a TVI noticiou que Fernando Alonso sofreu um acidente esta manhã, nos treinos para o Grande Prémio de Espanha. Isto quando o campeonato de Fórmula 1 ainda nem começou (trata-se de uma sessão de testes de pré-temporada). Talvez seja preferível os canais de televisão generalistas limitarem-se a falar de futebol, tema para o qual parecem dispor de várias centenas de especialistas.

Faz hoje trinta anos

Pedro Correia, 12.08.14

 

Era já madrugada e nós seguimos

quilómetro a quilómetro a corrida

Era já madrugada e nós corríamos

com aquele que levava ao peito as quinas

Era já madrugada e nós não víamos

o loiro Menelau e as belas crinas

dos imbatíveis cavalos do Atrida.

 

Era só Carlos Lopes que nós víamos

e com ele ganhámos a corrida

aquela madrugada e toda a vida.

 

Manuel Alegre

The times they have a-changed

José António Abreu, 13.08.13
Mesmo os que, por defeitos de idade, não viram em directo se lembram de Rosa Mota cortando a meta para a vitória na maratona dos Jogos Olímpicos de Seoul, em 1988. Pequenina, magrinha, ar simpático, braços bem erguidos de justificado orgulho, sovacos por depilar. Rosa Mota já conquistara o bronze nos Jogos Olímpicos de 1984 e, em 1987, fora Campeã do Mundo em Roma (para além de ter conseguido vários títulos europeus e vencido uma mão-cheia de maratonas importantes). Mas convenhamos que, grande atleta que indiscutivelmente era, nunca o termo «sensual» se lhe aplicou. Pior um nadinha: Rosa, como Carlos Lopes, Aurora Cunha, Fernando Mamede, os gémeos Castro ou, na verdade, ainda vários dos atletas portugueses da actualidade, revelava um país mais parecido com os tempos de Salazar (esforçado mas pobrezinho, ligeiramente digno de pena) do que com o país em que, poucos anos volvidos, os portugueses gostavam de se imaginar a viver.
Mas isto não é sobre Portugal. É sobre algo muito mais importante e cem por cento internacional: mulheres. Atletas, mais exactamente. Assistia eu ontem à sessão da tarde dos Campeonatos do Mundo de Atletismo, a disputar-se em Moscovo, quando as atletas do heptatlo me fizeram pestanejar e arregalar os olhos. Várias vezes. Mais de uma dúzia de raparigas altas, esbeltas, giras. Algumas com características inteiramente adequadas a protagonismos de anúncios de produtos de beleza – que, lá no país delas, podem bem ser uma realidade. Claro que sempre houve raparigas atraentes no atletismo. Por virtude de idade, lembro-me bem da relação amor-ódio que Heike Drechsler me inspirava (amor porque era um bocadinho mais gira do que a grande rival, Jackie Joyner-Kersee, ódio porque competia pela RDA). Por virtude de não assistir apenas a futebol na televisão, sei igualmente que existem hoje raparigas atraentes em muitas disciplinas do atletismo (e de outros desportos) para além do heptatlo. Basta pensar nos olhos e na boca de Blanka Vlasic. Ou nos olhos e no resto de Yelena Isinbayeva. E fosse ela menos gira (e simpática e boa conversadora) e os azares de Lolo Jones nos Jogos Olímpicos (queda em 2008 quando liderava destacada os 100 metros barreiras, quarto lugar na mesma prova em 2012) não teriam doído tanto. Finalmente, por virtude de ser bom a extrapolar conclusões a partir de amostras minúsculas, também estou ciente de que uma significativa parte da população mundial tem andado a ficar mais atractiva. Mas o quadro de participantes no heptatlo deste Mundial é assim a modos que um ridículo concentrado de boa aparência num sector onde a boa aparência não costumava abundar. E garanto que as fotos acima, uma selecção retirada do site oficial da Federação Internacional, estão longe de fazer justiça às raparigas.

Agora desculpem mas vou ver a sessão desta tarde, que deixei a gravar. A Lolo não está em Moscovo (snif) mas o heptatlo acabou hoje.

 

Nas fotos, da direita para a esquerda e de cima para baixo: Dafne Schippers (Holanda); Ellen Sprunger (Suíça); Ganna Melnichenko (Ucrânia); Grit Šadeiko (Estónia); Györgi Farkas-Zsivoczky (Hungria); Ida Marcussen (Noruega); Karolina Tyminska (Polónia); Katarina Johnson-Thompson (Grã-Bretanha); Kristina Savistkaya (Rússia); Laura Ikauniece (Letónia); Mari Klaup (Estónia); Nadine Broersen (Holanda); Nafissatou Thiam (Bélgica); Sharon Day (EUA); Yasmina Omrani (Argélia).

 

Adenda: Em nome da igualdade de género, gostaria de salientar que este arrazoado poderá quase de certeza aplicar-se também a atletas do sexo masculino. Mas outra pessoa qualquer que trate dessa parte. Não vou ser eu a colocar aqui fotografias de Renaud Lavillenie.

Uma (en)cruz(ilh)ada eterna

João André, 08.08.13

Na última semana tem-se falado intensamente das revelações sobre o programa estatal de doping na Alemanha Ocidental. Depois de se saber que tais programas existiam na Alemanha Oriental (e noutros países, especialmente do bloco de leste), estas revelações (que vão continuando) têm abalado o desporto alemão.

 

Isto não me surpreende de todo. Há uns meses vi uma exposição sobre a história da Alemanha no pós-guerra. Um dos aspectos aflorados era o desporto, o qual era visto não só como uma forma de aproximação das duas Alemanhas mas também como uma espécie de "proxy war", onde os próprios países iam para a guerra mas o faziam de forma amigável, sob a égide dos Jogos Olímpicos. Não é por isso estranho que vários países tivessem programas estatais de dopagem e muitas suspeitas nesse sentido existem.

 

Nos dias de hoje, quando o orgulho das medalhas nacionais é mais fugaz, os programas estatais poderão desaparecer lentamente, mas as pressões para a dopagem mantêm-se. Dwain Chambers, sprinter inglês, explicou que se dopava porque precisava disso para se manter entre os 5 melhores do mundo e que isso lhe trazia muito mais dinheiro. O escândalo da Balco, de Armstrong e outros são conhecidos. A questão é quais não o são.

 

A verdade é que, hoje, com a quantidade de suplementos que um atleta recebe sem levantar questões, é fácil para um treinador/massagista/nutricionista dopar um atleta promissor, muitas vezes desde tenra idade. É por isso que as sanções não resultam. Os responsáveis técnicos, se deixados livres, apenas escolhem nova vítima. Se quisermos um mundo sem doping, o caminho terá de passar por retirar retroactivamente todos os títulos e prémios (inclusive monetários) de quem se dopou, além de atribuir suspensões ao atleta e aos técnicos (bastante superior no caso destes últimos). A par disso, será necessário começar a testar sem piedade e a publicar todos os resultados de todos os testes (inclusive negativos).

 

Há demasiado dinheiro a correr no desporto para que o doping não seja um caminho apetecível (interessante artigo da Economist aqui). Se a opção for por um desporto limpo, então há que gastar dinheiro em mantê-lo como está. De outra forma mais vale permitir o doping. Pelo menos os milagres das nações que recebem os Jogos Olímpicos poderão ser mais facilmente explicados...

Caramba, até já sabem conduzir...

José António Abreu, 18.02.13
Danica Patrick (o link é para o site oficial mas, rapazes, se forem apreciadores de AC Cobras, ide antes aqui) obtém a pole position para as 500 Milhas de Daytona.

 

(É que serem melhores em medicina, direito e investigação científica um tipo ainda encaixa, agora ao volante... Bom, mantenhamos a calma: uma oval é uma pista fácil, com poucas curvas – e todas para o mesmo lado.)

Lauberhornrennen

José António Abreu, 18.01.13

Fiquei na dúvida se as duas senhoras de sessenta e tal anos que, numa manhã fresca de finais de Maio de 2010, passeavam com um cão (ou passeavam ocão?) nas ruas de Wengen seriam britânicas (pelas feições e sotaque, pareciam) e também se seriam lésbicas (pormenores desse género tendem a passar-me ao lado mas havia qualquer coisa que o sugeria). Em resposta à minha pergunta, uma delas voltou-se e apontou-me na encosta a zona de meta da pista de downhill.

(Fossem ou não inglesas lésbicas, é uma imagem curiosamente aconchegante, a de duas estrangeiras sexagenárias, suavemente apaixonadas uma pela outra, vivendo, na companhia de um cão, mais ou menos exiladas numa fria mas pitoresca povoação situada nas montanhas da Suíça Central. Acho eu. Mas avancemos.)

Fanáticos de futebol não considerariam completa uma primeira deslocação a Madrid sem uma visita ao Santiago Bernabéu. Do mesmo modo, fãs de desporto automóvel não se sentiriam bem dispensando, quando em viagem pela zona Oeste da Alemanha, uma visita ao Nürburgring Nordschleife. Encontrando-me em Wengen e ainda que, tal como sucede com quase todos os indivíduos nascidos e criados junto ao sopé da Serra da Estrela, nem sequer faça esqui (é entretenimento de fim-de-semana para lisboetas e portuenses), eu precisava de saber onde ficava a pista de downhill. Uma das duas mais famosas do mundo (a outra chama-se Streif e é – tinha de ser – na rival Áustria; mais exactamente na montanha Hahnenkamm, em Kitzbühel).

Se não faço esqui, gosto de velocidade. E de um pouco de loucura. E de cenários grandiosos. Vejamos: quatro quilómetros e meio (a mais longa prova da taça do mundo de esqui) para descer dos 2315 até aos 1290 metros de altitude a uma velocidade média superior a 100 km/h (máxima acima dos 140, recorde de 158). Uma secção estreita em os esquiadores passam sob a linha férrea de cremalheira que sobe de Wengen para Kleine Scheidegg (onde se pode mudar para outro comboio e trepar por dentrodo Mönch e do Eiger até Jungfraujoch, estação situada a cerca de 3500 metros de altitude, num trajecto totalmente desaconselhado a claustrofóbicos). O Hundschopf, um dos mais famosos saltos de todas as pistas de downhill (assim designado por – dizem – ter formato de cabeça de cão). Uma curva interminável chamada «canto dos canadianos» por vários canadianos lá terem caído há umas décadas. Um ponto conhecido como «o buraco dos austríacos» por – what else? – quase todos os austríacos em prova ali terem caído em 1954 (para grande satisfação dos suíços, certamente). E depois há o resto. A presença imponente dos picos Eiger, Mönch e Jungfrau (costumam ver-se bem na televisão, mesmo antes dos esquiadores chegarem ao Hunsdchopf). O tal comboio de cremalheira (a foto que aqui coloquei na Quarta-Feira passada foi tirada através de uma das suas janelas). O covil de Blofeld no filme de 007 Ao Serviço de Sua Majestade(aquele em que Bond era George Lazenby, casava e não ficava com grandes recordações de Portugal), no Schilthorn, do outro lado do vale. Um teleférico que sai de Wengen e, em 1656,9 metros de trajecto, sobe 947,5. Em 5 minutos.
A Lauberhornrennen (que é como quem diz «a corrida na Lauberhorn») disputa-se desde 1930 e, graças à neutralidade suíça, nem a Segunda Guerra Mundial impediu a sua realização (mas, como seria de esperar, quase só esquiadores suíços participaram nesses anos). Em 1991 houve uma morte e, ao longo das décadas, muitas pernas e braços partidos. É possível que certos desportos sejam demasiado perigosos para mentes com um grau sensato de sensatez. Esqui alpino, e especificamente a disciplina de downhill, só pode estar na lista: visualizem-se colocando a cabeça de fora da janela do carro na auto-estrada; considerem que estão quinze graus negativos; imaginem que a auto-estrada tem um declive médio de 23%; agora substituam o carro por um par de esquis. Que avanço já levam em relação à sensatez?

A Lauberhornrennen acontece amanhã de manhã, se o nevoeiro ou a queda de neve não complicarem. Dá no Eurosport às 11:30, com comentários de um senhor bem intencionado mas que diz sempre as mesmas coisas. Antes, às 9:30, com transmissão no Eurosport 2, realiza-se o downhill feminino de Cortina d'Ampezzo, outra pista espectacular (talvez a mais espectacular do sector feminino). E, já agora, dentro de uma semana ocorre o tal outro downhill mítico, na Streif de Kitzbühel, onde em 2008 o americano Bode Miller conseguiu imitar o Keanu Reeves sem recurso a efeitos especiais.

 

 
Para terminar, o vídeo da prova do vencedor de 2012, o suíço Beat Feuz, que este não participará por se encontrar lesionado. O Hundschopf é o primeiro salto, após a longa curva à esquerda. Ken Read, um canadiano que venceu em 1980, explicou uma vez que é preciso travar a fundo – pouco antes, segue-se a cerca de 130 km/h – e abordá-lo com muito cuidado porque é «como cair num poço de elevador».
 
(Republicado com alterações.)

De volta à rotina ou welcome back, Rui Santos

José António Abreu, 12.08.12

E agora, durante quatro anos, dezenas de modalidades desportivas ficam novamente remetidas à obscuridade. Sendo que se alguma coisa os Jogos Olímpicos demonstram é que, em termos de espectacularidade, o futebol está longe de justificar a hegemonia de que goza na maior parte do planeta. Como os norte-americanos costumam referir, trata-se de uma modalidade em que nada acontece durante a maior parte do tempo e é também das poucas onde se pode verdadeiramente jogar para o empate – com frequência, a zero.

O Bom Combate

Ana Cláudia Vicente, 01.08.12

«Voir loin, parler franc, agir ferme

 Pierre de Frédy

[Barão de Coubertin (1863-1937)]

 

[Foto: BBC Sport]

 

Se reais consequências se registarem após o arraial mediático du jour em torno do triste processo de qualificação para as finais olímpicas em Badminton, menos mal. Não deixa de ser justo e irónico que tal aconteça num território educativo tão admirado pelo pedagogo que reinstituiu Os Jogos na contemporaneidade.

Bem basta termos quase todos aceite que o futebol já não é o que era, e que muitas das regras básicas do desportivismo simplesmente deixaram de se lhe poder aplicar.

Força de vontade e uns quantos recordes

José António Abreu, 08.07.12

Décima sétima vitória em torneios do Grand Slam (recorde masculino absoluto; Pete Sampras, o segundo na lista, venceu catorze). Sétima vitória em Wimbledon (recorde de Pete Sampras e de William Renshaw* igualado). Recuperação do primeiro lugar no ranking ATP e garantia de igualar o recorde de número de semanas nesse posto (faltava-lhe apenas uma para atingir as 286 de Sampras), devendo mesmo ultrapassá-lo (não se prevê que venha a ser destronado pelo menos até aos Jogos Olímpicos). Trinta anos de idade (trinta e um dentro de um mês), mais cinco que os principais adversários. Casado, pai de duas gémeas de três anos. Nos últimos dois anos e meio, um período em que não conseguiu vencer qualquer Grand Slam (então escrevi isto e continua a aplicar-se) muitos deram-no como acabado. Not quite. É que nem pouco mais ou menos.

 

* Mas as vitórias de Renshaw foram na década de oitenta do século dezanove, altura em que o vencedor de um ano tinha entrada automática para a final do ano seguinte; só em 1922 todos os participantes começaram a ter de passar pelo quadro geral.

 

Adenda (Segunda-Feira, dia 9, 8:45h)

1. Ontem fazia tenções de o referir e depois esqueci-me: este foi o torneio dos atletas com trinta anos, uma vez que Serena Williams, também com essa idade, venceu no quadro feminino.

2. É um excelente momento para ler (ou reler) o artigo que, em 2006, David Foster Wallace escreveu sobre Federer (e o ténis em geral).

 

(Foto retirada daqui.)

Genuflexão

José Navarro de Andrade, 06.01.12

                                  

 

 

O alarido que para ali vai à volta de Tim Tebow, o quarterback dos Denver Broncos.

É melhor começar por uma explicação aos leigos. No futebol americano o quarterback é literalmente um capitão (de equipa), pois tem como primeira missão transmitir a táctica delineada pelo general (o treinador) à tropa macaca, formada por aqueles moços com envergadura de frigorífico que antes de uma jogada rodeiam o quarterback fingindo prestar atenção à estenografia oral que ele berra através do capacete, no centro de um estádio ululante. Os quarterbacks são as grandes vedetas deste desporto, dado que agregam às suas faculdades intelectuais (a sério: o futebol americano é a modalidade mais cerebral que existe), uma formidável destreza manual, um físico de adónis, um desprendimento olímpico face à multidão de fãs e uma conta bancária eloquente.

Ora o rookie Tim Tebow inaugurou uma prática antes impensável, a qual já foi crismada de tebowing (neologismo dicionarizado). Em que consiste ela? Basicamente em misturar a pose intensa de “O pensador” de Rodin com o abandono de “O desterrado” de Soares dos Reis, ou seja: em recolher-se num momento de oração quando um passe lhe sai bem, um touchdown é marcado, ou tão-só antes de o desafio se iniciar ou quando ele termina em vitória.

Num país laico como a América – ah pois é! – O gesto deste devoto filho de missionários baptistas provocou enorme celeuma. Uns execraram-no e troçaram dele, porque (re)afirmam que bola é bola, mesmo quando seja oval, Deus é Deus e a América está muito bem sem misturas; outros cantaram hossanas, porque não se cansam de (re)afirmar que nunca é demais agradecer o facto de Deus ter abençoado a pátria dos livres, lar dos bravos. Claro que os primeiros são democratas e os segundos republicanos, que a controvérsia é política, que estamos em ano de eleições e que os americanos têm o hábito de discutir as coisas.

Por certo nós, portugueses, ouviremos a polémica com cepticismo e olharemos o gesto com cinismo, ambas atitudes com que evidenciamos a nossa consabida superioridade intelectual. Ou não estaremos habituadíssimos a ver um qualquer Cleiderson do Feirense persignando-se à pressa, beijando três vezes a cruz que traz ao pescoço e adiantando premeditadamente o pé direito, quando entra em campo? Isto para suplicar ao Altíssimo que se distraia por uns momentos do governo do Universo e da arquitectura dos Tempos de modo a banhar de favores as evoluções de uma pelota pontapeada por aquele seu fidelíssimo. Normal, portanto.

Outos povos, outros costumes.

Nelson Évora

Patrícia Reis, 04.09.11

Não, não trouxemos medalhas para casa, como se isso fosse o mais relevante, mas vimos uma recuperação extraordinária de um grande atleta: Nelson Évora. O homem que esteve um ano a recuperar, que tem um parafuso no pé e é o quinto melhor do mundo. Nunca se pensa nisso, mas é a verdade: qualquer lugar a que um atleta deste nível vá parar significa que é o quinto, o sétimo, o décimo melhor do mundo. Melhor medalha do que isto? Não me parece.

Os meus heróis têm nome

Sérgio de Almeida Correia, 06.03.11

Se fosse pelos seus atletas e pelos dirigentes da Federação Portuguesa de Atletismo, este país seria um dos melhores do mundo. Aquilo que falta a Portugal não lhes tem faltado a eles. Essa gente não conhece limites. A adversidade é coisa que não existe no seu vocabulário. Estar na periferia não faz qualquer diferença. Ali só há trabalho, muita dedicação, talento puro, resistência à dor, às contrariedades, aos azares, à falta de subsídios, ao ostracismo a que durante a maior parte do ano a comunicação social os vota. Há décadas que é assim. E, não obstante as condições do país, as mudanças de governo e todas as dificuldades por que ciclicamente passam, são gente que quando cai se sabe levantar, caminhar sozinha, e, mais importante, apresentar resultados dando o exemplo. Fê-lo ainda há dias o presidente demissionário por causa de um erro de secretaria. Voltaram a fazê-lo este fim-de-semana os seus atletas nos Campeonatos Europeus de Atletismo de pista coberta. Da "infeliz" Sara Moreira, inscrita na prova errada, ao "dorminhoco" Marco Fortes ou ao "acabado" Rui Silva, todos eles prestigiaram as nossas cores em terras de França.
Se tudo isto não fosse uma evidência, aí estão Naide Gomes - medalha de prata no salto em comprimento - e Francis Obikwelu  - medalha de ouro nos 60 metros, com a marca de 6,53, batendo com toda a limpeza o inglês Chambers e o francês Lemaitre, principais favoritos à vitória -, a provarem uma vez mais a massa de que esta gente é feita. No caso de Francis com a particularidade de agora até treinar diariamente entre nós, no Jamor, com um treinador nacional, e de atingir o ouro, uma vez mais, aos 33 anos, numa altura em que já poucos, muito poucos a não ser ele o seu treinador, apostariam na possibilidade de ganhar uma medalha.
Seja numa perspectiva ética ou moral, ou simplesmente desportiva, os nossos políticos e a quase generalidade dos dirigentes do futebol nacional, a começar por um tal de Madaíl, deviam pôr os olhos no atletismo nacional e, se não for pedir-lhes muito, aprenderem alguma coisa com aqueles que defendem as nossas cores. Eles são hoje os meus heróis. E todos têm nome, embora muito poucos os conheçam.