Como se as balas tivessem ideologia
A CGTP convocou para o fim da tarde de hoje, em Lisboa, uma manifestação "solidária com os trabalhadores, sindicatos e povo hondurenhos". Por considerar que "os trabalhadores e o povo português não podem ficar indiferentes face às inaceitáveis violações dos direitos humanos e da soberania do povo das Honduras".
Certíssimo. Fico agora à espera de que a CGTP convoque uma manifestação "solidária com os trabalhadores, sindicatos e povo iranianos" e uma manifestação "solidária com os trabalhadores, sindicatos e povo chineses". Por considerar que "os trabalhadores e o povo português não podem ficar indiferentes face às inaceitáveis violações dos direitos humanos" dos povos do Irão e da China.
E fico à espera disso por considerar que a indignação selectiva, pelas Honduras, de nada vale se ao mesmo tempo se estender um véu cúmplice de silêncio sobre as atrocidades que têm vindo a ser cometidas no Xinjiang e no Irão. Pior: ficaria mesmo a suspeita, mais que legítima, de que a CGTP não está afinal preocupada com a violação dos direitos humanos, mas a servir, uma vez mais, de dócil instrumento da visão estratégica e dos interesses eleitorais do Partido Comunista, incapaz de chamar bala assassina a uma bala assassina desde que seja disparada pela polícia e pela tropa de um 'país irmão' ou em guerra ideológica com os Estados Unidos. Como se as balas também tivessem ideologia.