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Delito de Opinião

Sócrates 'sotto voce'

Pedro Correia, 17.06.09

 

 

1. A derrota eleitoral, com o PS colocado cinco pontos percentuais abaixo do PSD, fez diminuir o tom de voz de José Sócrates: o 'animal feroz' apareceu esta noite com ar domesticado numa entrevista à SIC, conduzida por Ana Lourenço. Nada que se parecesse com o tom arrogante, quase impertinente, utilizado pelo primeiro-ministro noutra entrevista ao mesmo canal, fez agora seis meses. Nada que se parecesse com o tom duro e cáustico do chefe do Governo numa entrevista mais recente à RTP, conduzida por Judite Sousa e José Alberto de Carvalho.

Foi desta vez um Sócrates em sotto voce que surgiu na pantalha. Quase irreconhecível na forma, mas imutável no conteúdo: vive num país que só ele vê. Um país com as contas públicas equilibradas, "melhor educação", menos desigualdades sociais do que em 2005, mais abonos de família, o inglês generalizado no ensino básico e muitos computadores Magalhães distribuídos às criancinhas.

Azar: os eleitores que acabam de o penalizar nas urnas vêem um país diferente - um país em recessão, com a maior crise económica dos últimos 35 anos e meio milhão de desempregados oficialmente contabilizados, 40% dos quais sem subsídio de desemprego. Um país pior do que estava há quatro anos.

 

2. Foi pena que a entrevistadora, certamente por falta de tempo, não o tivesse inquirido sobre a quebra de sucessivas promessas eleitorais. Faltou falar dos impostos que deviam ter diminuído e afinal aumentaram. Faltou falar do referendo europeu que ficou pelo caminho. Faltou falar dos 150 mil novos empregos que não passaram de propaganda. Faltou falar sem sofismas das contas públicas que permanecem descontroladas, segundo acaba de confirmar o insuspeitíssimo Banco de Portugal. Faltou falar dos 'estudos de viabilidade' do TGV jamais concretizados. Faltou falar das severas críticas feitas ao Executivo pela ala esquerda do PS, protagonizada por Manuel Alegre. Faltou falar de vários ministros incompetentes que não foram substituídos em tempo útil.

 

3. Mudou o registo vocal, permanecem os auto-elogios no discurso deste homem cada vez mais insensível aos ecos da sociedade. "Eu estou muito satisfeito comigo", concluiu Sócrates. Parece não ter aprendido nada com as europeias além da conveniência em falar num tom menos estridente. Aprenderá mais alguma coisa com as legislativas?

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