Desacordando ortograficamente
Sabendo que metade do país está à espera da minha opinião sobre o (Des)Acordo Ortográfico (e à falta de melhor assunto para escrever), deixo aqui o meu ponto de vista. Não tenho, como o Pedro, uma opinião apaixonada porque não é assunto que me apaixone. Não posso discutir (mais uma vez, como o Pedro) o ponto de vista científico porque os meus conhecimentos de linguística e semelhantes são quase nulos. Deixo apenas aquilo que penso.
Primeiro que nada, não vou mudar a forma de escrever por causa de um acordo. Habituei-me a escrever de uma determinada forma e não será o AO que irá mudar isso. Com o tempo, e à medida que vá lendo textos, artigos e livros escritos "ao abrigo do AO", poderei começar a absorver essa forma de escrever. Não creio que retirarei todas as consoantes mudas porque a palavra me parece "coxa" sem ela, porque a consoante não é muda (pelo menos para mim, que leio o "p" em Egipto") e porque de facto a consoante pode ser muda, mas altera a palavra. Não fecho no entanto, as portas a tal possibilidade.
Quanto ao ensino da língua portuguesa, isso não me incomoda minimamente. Aprendi um português diferente dos meus pais e dos meus avós (lembro-me de o meu avô resmungar por já não se escrever "pharmácia") e não deixei de comunicar com eles. Os meus filhos e netos aprenderão um português diferente do meu. Isso incomodar-me-à a nível pessoal, mas não me fará diferença em termos de princípios.
A questão política já é um disparate. Outros países não adoptaram o acordo, não gostam dele, entendem que não faz sentido, etc, e no entanto Portugal aceita-o unilateralmente. Pior, impõem-o aos seus funcionários. Aqui entra também a questão legal: como impôr sanções a funcionários que não concordem com o acordo quando não há (nem pode haver) uma moldura legal para o enquadrar? Da mesma forma, quem não concorde com o acordo não pode impôr aos funcionários subordinados que não o use.
Resumindo: em princípio nada tenho contra o acordo, mas não farei qualquer esforço para o usar. As línguas mudam orgânicamente e um dia destes veremos o "qu" a cair e a ser substituído pelo "k" quando a "geração SMS" chegar ao poder. Nada disto é novo. O assunto não termina aqui. Daqui por 50 anos teremos outro acordo. E este desacordo parecerá coisa mínima.