Esmiuçando
Está o Pedro Correia muito incomodado, sinto que até ofendido, com a minha reacção à entrevista à "Visão" de Fernando Moreira de Sá. Paralelamente, e até reforçando a pertinência do seu incómodo, alguns comentários ao meu postal demonstram-me que as minhas razões (e as irrazões) não foram ali competentemente explicitadas. São estes os dois motivos para que regresse às desagradáveis declarações (que o entrevistado já referiu como correctamente editadas):
a) Moreira de Sá lembra que vários blogs se empenharam nas campanhas de Passos Coelho, algo que vários comentadores aqui referem. O que deixa entender que depreenderam do que eu escrevi que essa actividade política no bloguismo me é uma questão a refutar ou a injuriar. Penso exactamente o contrário: a democracia faz-se com partidos e com políticos, neles não se esgota mas não os pode repudiar. Como tal é perfeitamente legítimo e absolutamente desejável que se tomem posições públicas, em favor ou desfavor de políticos e/ou partidos. In-blog ou fora dos blogs [Já agora nas últimas eleições também eu anunciei o meu sentido de voto, primeiro aqui, depois aqui. E se então optei pelo tom jocoso isso em nada diminuia a minha vontade eleitoral]. Prefiro que essas opiniões sejam assinadas, frontais e muito me desagrada o anonimato. Em particular o bloguista, seja nos comentários como, e muito em especial, em postais. Por isso, por exemplo, nos blogs muito lidos de pendor socratista tanto distingo entre o esconso Câmara Corporativa ou o democrático Jugular. Pois numa sociedade democrática não deve haver motivos para o anonimato da expressão política. E se os houver então que se combatam.
Face a isto o facto de se referir que houve um conjunto de blogs (entre os quais o Delito de Opinião também é citado) que se juntaram ao esforço eleitoral de Passos Coelho não me é problema, é ou foi característica. Saudável. E para mais porque foi tudo explícito, qualquer leitor o compreenderia.
b) Foi neste âmbito de esforço bloguista que o Pedro Correia foi referido na desengraçada entrevista, explicitamente afirmado como presente de "cara descoberta". Algo que não é surpresa para quem, como eu, o lê há anos. E leio-o com tamanho agrado que me desvaneci com os convites que me fez para participar nos blogs que coordena. Ou seja, nem considero o bloguismo politicamente empenhado como algo negativo nem considero que as referências que ali foram feitas ao Pedro Correia o possam beliscar, minimamente que seja.
Mas esta é a minha ideia e a minha sensação. Que posso defender ou explicar, mas não posso impor. Assim sendo se o Pedro Correia se sentiu melindrado com a minha formulação só o posso constatar, e aceitar como legítima a sua recepção do texto. Como é ela inversa à minha ideia tenho que admitir que deriva da incompetência com que expus, de uma verve poluída pelo que costumamos referir, pejorativamente, como o "indignismo de sofá", a irreflexão que faz brotar textos desarranjados, e tantas vezes descabidos. E dizer que lamento a mágoa causada, refuto qualquer hipotética mácula que possa ter provocado, e que lhe (te) peço que esqueça(s) a culpa do autor do texto.
c) A verdadeira questão, isso que me indignou e me indigna, é completamente outra. E que julguei tão óbvia, descaradamente óbvia, que desnecessária de sublinhar, meu erro. É o facto, risonhamente anunciado por Moreira de Sá, de um conjunto de bloguistas terem associado a esse esforço de apoio eleitoral público um conjunto de más práticas, falsificação de identidades, manipulação de informações, poluição do debate público, factos ocorridos, diz ele, fundamentalmente no seio das redes sociais. E isso não é o bloguismo politicamente empenhado, é aldrabice, desonestidade. Se todo esse processo teve real influência eleitoral, como julga Moreira de Sá, ou se não o teve, é-me indiferente. Como me são indiferentes as causas que o levam a, agora, vir anunciar tais derivas. O que me choca, indigna, é a total desonestidade dessas práticas. Que eram políticas.
O facto é que sobre essa trapalhada nem me passou pela cabeça que o Pedro Correia estivesse envolvido. Nem vale a pena explicar porquê, basta conhecê-lo. Por isso a total acrimónia que usei sobre o assunto no próprio Delito, que ele coordena. Pois o caso não tem a ver com ele. Repito, lamento que isso não tivesse ficado totalmente explícito no(s) texto(s) que dediquei ao assunto.
d) Sobre as assessorias governamentais. Sou adverso à partidarização da administração pública. Mas uma coisa é defender a autonomia do serviço público face ao poder político. Já outra coisa, diversa, é negar que os serviços governativos exigem o trabalho de gente de confiança política (e, também, pessoal). Ou seja, os gabinetes de incidência política exigem a cooptação de pessoal específico, que pode vir da função pública ou não. Fazendo essa cooptação com normalidade, sem despesismos ou nepotismos, mas também sem cedências à demagogia que refuta essa necessidade, no fundo uma deriva anti-democrática que refuta a legitimidade da actividade política e a sua especificidade.
Dito isto nada me choca, nada tenho contra, o facto de bloguistas (jornalistas ou outros) que trabalharam politicamente para a ascensão do novo governo tenham sido cooptados para o trabalho político desse mesmo governo. É normal, é democrático. O que me choca, radicalmente, é que aqueles que foram flibusteiros das redes sociais tenham sido cooptados para esse trabalho político. E isso é uma coisa completamente diferente. Foi contra isso que desembestei. E que desembestarei.
e) Finalmente, e apesar de julgar ter agora explicitado, até demoradamente, o que quis significar anteriormente, não posso apagar a ideia da mágoa causada no Pedro Correia pelo meu pouco burilado texto. Julgo que essa poluirá a convivência intra-bloguística, tão simpática ela é aqui no Delito de Opinião, de que ele é maestro. Assim sendo penso ser melhor, espero que sem zangas legadas, retirar-me do painel, mantendo-me adepto, leitor e comentador. A todos agradecendo pelo convívio. Em particular ao Pedro Correia.