Decorre na blogosfera um debate sobre o chamado “dia de reflexão”, com interessantes contributos do Nuno Gouveia, Rodrigo Saraiva e Vítor Dias. Eu sou contra a existência deste mecanismo. A meu ver, o “dia de reflexão” apenas faria sentido numa sociedade desinformada, com media poucos desenvolvidos, alheia à coisa pública e mais ou menos afastada dos centros de decisão política.
Ora neste momento em Portugal não se verifica nenhuma destas condições. Pelo contrário. Assistimos a uma profusão de comícios, debates, artigos, mesas-redondas, tempos de antena e propaganda de toda a espécie. Os jornais e os noticiários televisivos veiculam informação política de forma sistemática. Fala-se das eleições na blogosfera e nos cafés. Só indivíduos completamente absortos na sua vida quotidiana – que na sua esmagadora maioria são abstencionistas crónicos – ainda poderão ter dúvidas em relação ao seu sentido de voto. Neste contexto, o “dia de reflexão” não serve qualquer propósito.
Por outro lado, o “dia de reflexão” introduz uma espécie de movimento paradoxal na sociedade. Durante várias semanas, a sociedade e os partidos mobilizaram-se para apelar ao voto e à discussão de temas políticos. De súbito, exige-se legalmente que os movimentos organizados, os cronistas, os comentadores, os jornalistas e o cidadão se silenciem justamente nas 24 horas que precedem o evento eleitoral. É também por isso – ou sobretudo por isso – que o “dia de reflexão” é habitualmente marcado por uma outra disputa, entre aqueles que acabam a violar a lei (incentivando ao voto nos blogues ou imiscuindo-se em propaganda dissimulada) e os que passam o sábado a denunciá-las. Com franqueza, é um triste espectáculo que se podia evitar.
[adaptado de um texto que escrevi aqui a um outro propósito].