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Delito de Opinião

Arrumar a biblioteca (V)

Pedro Correia, 11.09.13

  

Norman Mailer, Brian Wilson e Maria de Lurdes Pintasilgo

 

Falava eu ontem aqui de capas de livros. Dando exemplos positivos, como prefiro por natureza e vocação. Mas vale a pena mencionar também casos negativos, mesmo catastróficos, de capas que desvirtuam os livros e são feitas a pensar em tudo menos nos leitores com maior apetência, à partida, para adquirir essas obras.

Certos autores são particularmente massacrados. Reparem nestes dois casos que aqui destaco. De editoras diferentes, mas fustigando o mesmo escritor. Norman Mailer foi brindado com uma execrável capa no primeiro volume da edição portuguesa da sua obra-prima Os Nus e os Mortos, com a chancela das Publicações Europa-América. Mas não recebeu melhor tratamento por parte do Círculo de Leitores, em Os Duros não Dançam. Num caso, letras garrafais e um desenho tosco, nada adequado à letra nem ao espírito da obra; noutro caso, um fotograma de má qualidade do filme, com Isabella Rossellini e Ryan O'Neal, num grafismo rudimentar.

Não cesso de me espantar com este péssimo tratamento editorial dispensado a autores conceituados, com largos milhares de leitores. Costumo dizer que dá o mesmo trabalho fazer mal e fazer bem, mas é muito mais recompensador fazer bem. Mas para fazer bem, valha a verdade, é preciso saber. E alguns não sabem.

É no entanto caso para dizer: se não sabem, aprendam. Vejam, leiam, informem-se, comparem. Estudem as nossas melhores tradições nesta matéria. Ou, pelo menos, atentem em bons exemplos estrangeiros. Deixo aqui duas capas, muito diferentes, em que podem inspirar-se: The First Forty-Nine Stories, de Ernest Hemingway (Arrow Books), e The First World War, de A. J. P. Taylor (Penguin Books). São ambas competentes sem precisarem de ser extraordinárias.

Enquanto escrevo, escuto aquele que considero o melhor disco de música popular anglo-americana de todos os tempos: Pet Sounds, dos Beach Boys. "Wouldn't it be nice if we could wake up / In the morning when the day is new".

 

 

Entro na fase da ordenação dos livros nas prateleiras. Qual o critério a adoptar?

A primeira separação de águas ocorre por nacionalidades. Autores portugueses para um lado, autores estrangeiros para outro.

Os portugueses serão cerca de um terço do total, embora esta percentagem esteja substancialmente reduzida no campo da literatura de ficção. Mais fáceis de arrumar, portanto.

Concentro-me para já nos autores estrangeiros. E volto a traçar nova linha de fronteira: literatura (romance, novela, conto, crónica, poesia, teatro) para um lado, tudo o resto (ensaio, história, biografia, memórias, etc) para outro.

O grosso da coluna é composto por ficção. Nova dúvida: vale a pena estabelecer divisões por idiomas ou nacionalidades?

I know there's an answer, canta Brian Wilson.

 

Dou um exemplo. De autores brasileiros. Tenho obras de figuras tão diversas como Arnaldo Jabor, Autran Dourado, Carlos Drummond de Andrade, Chico Buarque, Clarice Lispector, Erico Veríssimo, Fernando Sabino, Graciliano Ramos, Jorge Amado Josué Montello, Laurentino Gomes, Luís Fernando Veríssimo, Lydia Fagundes Telles, Machado de Assis, Marçal Aquino, Millôr Fernandes, Nélida Piñon, Nelson Motta, Nelson Rodrigues, Patrícia Melo, Raduan Nassar, Rubem Braga, Rubem Fonseca, Ruy Castro e Vinicius de Moraes.

Outro exemplo: autores espanhóis. Vejo por aqui, amontoados entre os restantes, livros de Antonio Muñoz Molina, Benito Pérez Galdós, Camilo José Cela, Carmen Posadas, Enrique Vila-Matas, Federico García Lorca, Fernando Savater, Francisco Umbral, Javier Marías, Juan José Millás, Juan Ramón Jiménez, Manuel Vásquez Montalbán, Manuel Vicent, Maruja Torres, Pérez-Reverte, Rosa Montero e Torrente Ballester. Já para não falar da nossa Rosalía de Castro, alma poética da Galiza.

Separo-os?

Mas, se o fizer, onde incluirei os autores latino-americanos de língua castelhana? Junto aos brasileiros ou colados aos espanhóis? E para onde irá um autor como Vargas Llosa, que tem a dupla nacionalidade (peruana e espanhola)?

Isto das listas dá muito trabalho. E por vezes, se não for tudo bem pensado, dá asneira. Será possível que Maria de Lurdes Pintasilgo -- primeira e até hoje única mulher a chefiar um Governo em Portugal -- não figure na lista elaborada pelo Expresso dos 106 portugueses que mais se destacaram, dos nascidos entre 1922 e 1972, como leio aqui?

 

É o momento de perguntar a vossa opinião. E de ouvir For the Stars, disco que reuniu dois nomes de origens musicais muito diferentes: Anne Sofie Von Otter e Elvis Costello. Nunca me canso de o escutar. Vou partilhar uma das faixas convosco.

 

Até amanhã.

 

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