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Delito de Opinião

Pausa à mesa do póquer

Pedro Correia, 16.07.13

 

Imaginem uma mesa onde se joga póquer. À volta da mesa, quatro cadeiras. Nessas cadeiras estão sentados quatro homens: Aníbal, António, Paulo e Pedro. Cada qual fazendo bluff, temendo as cartas que os restantes possam lançar.

A política portuguesa, por estes dias, transformou-se nisto. Há um país inseguro, que sustém a respiração, suspenso destas cartadas. Um país sob intervenção externa, que há mais de dois anos perdeu a soberania financeira, aguarda que naquela mesa termine o jogo. Sem a mais remota esperança que daqui resulte uma solução mais sólida e mais estável.

 

Passaram apenas duas semanas desde que foi tornada pública a demissão de Vítor Gaspar, acompanhada de uma carta que constitui um notável contributo para a antologia do humor negro na política portuguesa. "Os riscos e desafios do próximo tempo são enormes. Exigem a coesão do Governo. É minha firme convicção que a minha saída contribuirá para reforçar a sua liderança e a coesão da equipa governativa", dizia o ex-titular das finanças nessa missiva supostamente dirigida ao primeiro-ministro mas tendo afinal por destinatários dez milhões de portugueses, inaugurando o estilo "carta aberta" no exercício da governação.

Quinze dias depois, tudo parece ter regressado aos penosos dias do pântano - num teste quase desesperado à liderança e à coesão, palavras habitualmente invocadas na razão inversa da sua existência, como Gaspar bem sabia quando as colocou na sua carta que abriu oficialmente a saison de crises políticas.

Não admira, por isso, que um dos quatro opte por uma pausa no mais remoto e desabitado recanto do território português. Perfeita antítese da atribulada política portuguesa por estes dias, o plácido arquipélago das Selvagens. Com apenas quatro habitantes e banhado pelas águas mais limpas do mundo, como as classificou o oceanógrafo Jacques-Yves Cousteau.

 

A Bolse treme, levando Lisboa ao terceiro pior desempenho do mundo? Os juros disparam? Há novos pedidos de demissão na equipa das finanças? Chovem acusações de que se pretende "institucionalizar o caos"? Nada que o som das cagarras não dissipe enquanto se contempla o vasto Atlântico que inspirou os navegadores das naus de Quinhentos.

Talvez elas nos tragam notícias do eclipsado Gaspar, o ex-ministro em quem o chefe do Governo costumava "confiar plenamente" em dias que parecem já muito distantes. Talvez elas contribuam para atenuar o choque das contínuas surpresas em que se transformou a montanha russa da política nacional. Talvez elas ajudem a revigorar o supremo árbitro do sistema, mais eloquente nos longos períodos de silêncio do que no esporádico uso da palavra.

Ou talvez não.

 

6 comentários

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    Pedro Correia 16.07.2013

    O trunfo é "asses"? Hum... já não percebo nada deste jogo.
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    da Maia 16.07.2013

    Trufas? O porker? Não!
    Esta modalidade é: "Telhas... segura-as"!

    O que pode estar do outro lado?
    Só um poker de novenas, pois ali o straight flush está fora de questão, e os ases estão deste lado.
    Contra as novenas, os ases nem precisam ajoelhar.
    As coisas seriam diferentes se houvessem três paus seguidos... assim, vai ser desfrutar e recolher fichas.
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    Pedro Correia 17.07.2013

    Podem faltar paus. Mas nos últimos dias tenho visto desfilar muita cara de pau na TV. Um autêntico straight flush.
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    da Maia 17.07.2013

    Pois, os paus estão lá... mas não têm os valores certos.
    "A 9 2" não permite nenhuma sequência... será um simples flush, o bluff foi descoberto.
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    Pedro Correia 17.07.2013

    Pois. Como estamos em austeridade, resta-nos o 'flush'. Nada mais.
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