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Delito de Opinião

Regresso ao passado

Pedro Correia, 28.03.13

José Sócrates tem, naturalmente, todo o direito à palavra. Ninguém aliás lhe negou esse direito: o ex-primeiro-ministro quebrou só agora o silêncio porque assim o entendeu. E vai voltar a quebrá-lo em sessões contínuas no canal público de televisão, algo sem paralelo na Europa. Ninguém imagina Tony Blair a analisar a governação de David Cameron como comentador residente da BBC, ou José Luis Zapatero a fazer marcação a Mariano Rajoy com púlpito semanal na TVE, ou Nicolas Sarkozy a dissecar regularmente os actos de François Hollande como animador político nos estúdios da France 2.

O problema de Sócrates não é o silêncio. O problema não é sequer esta originalidade tão portuguesa de ter como comentadores televisivos, como se fossem figuras isentas, alguns dos maiores protagonistas da cena política doméstica, que a todo o momento teriam necessidade de fazer declarações de interesses: afinal de contas, só os escuta quem quer.

O problema de Sócrates é surgir como um insólito plágio de si próprio. Para ter verdadeira eficácia, precisaria de ser um Sócrates reinventado. Precisaria de surpreender os portugueses, recriando-se como figura pública neste seu regresso ao comentário televisivo num remake do tirocínio mediático que o guindou à liderança do PS, em 2004.

Mas, na longuíssima entrevista à RTP, surgiu afinal o Sócrates de sempre.

A entrevista esgotou-se num anacrónico regresso ao passado, transportando-nos a 2011. E serviu para confirmar como a vida política acelera de forma vertiginosa. Foi apenas há dois anos e parece ter sido há duas décadas.

Na política, como no teatro, é fundamental não falhar o tempo - por lentidão excessiva ou manifesta precipitação. Sócrates é um actor consumado, mas ficou-me a sensação de que falou no tempo errado. Algo ainda mais estranho porque foi ele mesmo que o escolheu.

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