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Delito de Opinião

Leituras e manias

Leonor Barros, 16.05.09

Há tentações a que um amante de livros não consegue resistir. Uma novidade acabada de chegar do escritor de eleição, os livros arrumados e virgens, o aroma que as páginas acabadas de imprimir soltam. Desgraçadamente qualquer livro, independentemente do seu autor ou da qualidade do conteúdo, consegue soltar aquela fragrância irresistível. Mandasse eu e declararia quais os livros, talvez quais os autores deviam sair perfumados da gráfica. Não há pior do que sentir-me seduzida pela fragrância de livros de escrita duvidosa, a traição a que os sentidos nos obrigam amiúde. Desses fujo, não vá perder-me encantada e acabar a ler romances de vão de escada.

Naquele dia não houve fragrância. Excluamos, pois, este factor de sedução. Naquele dia, na Feira do Livro, os olhos ter-me-ão brilhado, quando chegada à caixa com três livros me informaram que, se comprasse quatro, o mais barato era oferta. E porque aos livros não se viram as costas e tamanha generosidade livreira é inaudita por cá, retomei o périplo anteriormente interrompido pela auto-disciplina a que surpreendentemente me havia submetido. Rumei direita e sem hesitação a um livro que namorara meses antes, também ainda desgostosa pela quase ausência de livros brasileiros no certame luso e Os Lados do Círculo de Amílcar Bettega juntou-se a Um Passado Perfeito de Leonardo Padura, O Melhor da Comédia da Vida Privada de Luís Fernando Veríssimo e a O Planalto e a Estepe de Pepetela. E estaria tudo a correr muito bem, se não tivesse entretanto regressado ao livro e esbarrado em dois, logo dois, dois pontos e vírgulas, na primeira página. Num texto nutro especial animosidade contra os ditos. Erguem-se na prosa como barreiras, um salto a que obrigam para que se prossiga. Incomodam-me, fazem-me parar expectante na enumeração que se adivinha e, admito-o, irritam-me, detestto-os. Não sei se volte à Feira e reclame o produto defeituoso ou faça o que os leitores sem manias fazem: ler o livro.

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