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Delito de Opinião

Cabelos curtos na noite mais longa

Pedro Correia, 25.02.13

 

Não é todas as vezes que surge uma figura quase lendária do cinema ao vivo no televisor. Aconteceu-me esta noite, ao ver Emmanuelle Riva na longa festa dos Óscares: estava nomeada pelo principal papel feminino em Amor, de Michael Haneke - um dos melhores filmes que vi nos últimos anos. Gostaria que a inesquecível intérprete de Hiroxima, Meu Amor levasse o prémio na viagem de regresso a Paris, sobretudo no dia em que fez 86 anos, mas a estatueta acabou por ficar bem entregue: a melhor actriz do ano, na opinião dos jurados da Academia de Hollywood, é Jennifer Lawrence - pura explosão de talento num filme que me cativou, Guia para um Final Feliz, de David O. Russell.

O melhor actor, sem surpresa, foi Daniel Day-Lewis, com um inexcedível desempenho em Lincoln que o torna campeão no seu género: nenhum outro intérprete havia conquistado até hoje três estatuetas (proeza que ele conseguiu com O Meu Pé Esquerdo, de Jim Sheridan, e Haverá Sangue, de Paul Thomas Anderson, além deste, sob a competente direcção de Steven Spielberg).

Mas o momento da noite foi a surpreendente aparição da primeira dama norte-americana para anunciar o Óscar de melhor filme entre as nove longas-metragens nomeadas. Em directo da Casa Branca, com pompa e circunstância, Michelle Obama abriu o envelope para pronunciar a palavra de quatro letras que fez vibrar Ben Affleck de satisfação: Argo, realizado com mão segura, foi proclamado grande vencedor nesta despudorada intromissão da propaganda governamental na festa dos Óscares. Se algo semelhante tivesse sucedido por bandas cá da velha Europa, não faltariam almas indignadas bradando justamente contra a ligação promíscua do espectáculo ao poder político.

Ang Lee, que dirigiu A Vida de Pi, foi considerado o melhor realizador de 2012, como já fora em 2005, com O Segredo de Brokeback Mountain. O cineasta de Taiwan dirigiu uma palavra de carinho à mulher com quem está casado há 30 anos, gesto repetido pouco depois com Daniel Day-Lewis em relação à mulher, Rebecca Miller, com quem deu o nó em 1996. Hollywood, em matéria de separações, já não é o que era...

 

E que mais?

Barbra Streisand pisou pela primeira vez o palco em cerimónias do género desde 1977, para homenagear o falecido Melvin Hamlisch, cantando The Way We Were, uma das canções da minha vida. Jack Nicholson, o mestre-de-cerimónias final, está consideravelmente mais velho e mais gordo. Catherine Zeta-Jones e Jane Fonda, pelo contrário, estão bastante mais esbeltas e muito mais novas. Quase tão jovens como Anne Hathaway, que levou para casa a estatueta destinada a premiar o desempenho de melhor actriz secundária pela sua interpretação cantada em Os Miseráveis. Nada esbelta está Adele, vencedora do Óscar da melhor canção (em parceria com Paul Epworth), mas parece que ela não se rala nada com isso.

E eu também não, desde que ela continue a cantar desta maneira.

 

O meu filme favorito, 00.30 Hora Negra, levou apenas o Óscar de melhor montagem de som - a meias com Skyfall, num dos raríssimos empates até hoje registados em noites de distribuição de estatuetas. Amor, realizado pelo austríaco Michael Haneke, recebeu justamente o prémio para melhor filme de língua não-inglesa. Christoph Waltz é melhor actor secundário por Django Libertado, película que também valeu ao seu realizador, Quentin Tarantino, o Óscar de melhor argumento original - repetindo assim a proeza alcançada em 1994 com Pulp Fiction.

Seth MacFarlane, como anfitrião estreante, esteve em grande nível, sobretudo ao cantar We Saw Your Boobs - uma das melhores surpresas da noite. E Charlize Theron, coadjuvada por Anne Hathaway, relançou a moda do cabelo curto, que não tardará a pegar como fogo na pradaria.

E agora, se me dão licença, vou dormir.

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