Até sempre, João
Começámos mal: pegámo-nos, num blogue onde eu me estreava e ele era comentador habitual com o nick J.C. (ver os comentários ao post). Mas logo aí se percebeu que as nossas divergências seriam civilizadas e saudáveis, coisa de gente que se respeita. Depois, com o tempo e muitas trocas de ideias em caixas de comentários, veio a amizade virtual. Implacável na defesa das suas teses (era muito mais conservador do que eu), o João era sempre de uma elegância irrepreensível e tinha uma ironia fina, subtil, que me divertia e me vergava. Era mestre no trocadilho. Tivemos despiques memoráveis, de que ficará o registo aqui no Delito e a saudade na minha memória. Um dia, a amizade passou de virtual a real, carne e osso a confirmar a empatia e a confiança. Foi um anfitrião insuperável nas suas ilhas de adopção, territórios mágicos a que me rendi sem retorno desde o primeiro olhar, e a que voltei e voltarei sempre que a vida mo permitir. A última vez que o vi foi no Porto, já em tratamento e consciente do seu estado grave. Tomámos um café, conversámos e rimos como se tudo estivesse bem, e não pude deixar de reparar no estoicismo de quem tudo fazia para manter o prumo e não dar o flanco à doença. Quando me despedi, apesar dos meus protestos fez questão de me acompanhar ao carro e abrir-me a porta, galante como sempre. Sorridente, espicaçou-me com o seu tema preferido pela última vez: "O que é que pensas, que eu sou um desses mouros que não sabem comportar-se com uma senhora? Aqui no Porto ainda há cavalheiros, ora essa!".
Era um homem de coragem e provou-o até ao fim. Vai fazer falta, tanto ao DO - onde será insubstituível - como aos amigos. A vida continua, como sempre. Mas continua mais pobre.