Morrer não é fácil
«Morrer, porém, não é fácil,
ficam sombras nem sequer as nossas,
e a nossa voz fala-nos
numa língua estrangeira.»
Regressei a estes versos de Manuel António Pina ao saber, há escassos minutos, da sua morte. Sabia-o gravemente doente mas imaginei sempre que teria uma vez mais capacidade de resistir. Era há muito seu leitor, admirador dos seus textos inconfundíveis. Em verso e em prosa.
Calou-se a voz do Prémio Camões 2011, de um dos nossos melhores cronistas, de um escritor "condenado à poesia", de um grande jornalista que foi capaz de manter através dos anos um olhar de espanto jovial e juvenil perante os pequenos milagres quotidianos sem calar palavras de indignação perante todas as formas de injustiça que ainda sufocam o ser humano.
Escrevi sobre ele em vida, escrevo estas apressadas linhas na hora da sua morte. E volto sempre, comovido, à sua poesia: «No quarto ao lado alguém / a noite passada morreu, / provavelmente eu. / Os livros, as flores / da mesa de cabeceira / conhecerão estas últimas coisas / em algum sítio da minha alma?»