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Delito de Opinião

A inevitabilidade das portagens

Carlos Barbosa de Oliveira, 04.05.09

 

Se bem percebi, o JM Coutinho Ribeiro manifesta, num post em baixo, discordância quanto à criação de portagens que reduzam a entrada de automóveis nas cidades. Pessoalmente são favorável, por razões que expliquei num artigo publicado no site do Clube de Jornalistas, em 2005.
Escrevi, então, que qualquer candidato às autárquicas interessado em resolver os problemas de Lisboa deveria anunciar a necessidade de introduzir portagens. Mantenho a mesma opinião e quase aposto que até 2013 essa medida será tomada, pelas seguintes razões:
Primeira: todos sabem que, a nível mundial, é crescente a consciencialização dos poderes políticos para os problemas resultantes da toxicidade do ar, que afecta especialmente as pessoas com problemas respiratórios, os asmáticos, os idosos e as crianças, estimando alguns pediatras que a sujeição das crianças aos gases provenientes dos escape dos automóveis pode ter, mais tarde, efeitos extremamente prejudiciais. (numa altura em que os governos querem reduzir as despesas com a saúde, não faz sentido que uma medida deste género não seja tomada).
Segunda: nenhum candidato desconhece que o automóvel ocupa o primeiro lugar na lista dos maiores inimigos das cidades, em virtude das quantidades de óxido de azoto, monóxidos de carbono e chumbo que a sua circulação lança para a atmosfera.
Terceira: todos os candidatos sabem que estudos realizados num grande número de países industrializados revelaram que a poluição, principalmente a provocada pela libertação dos gases dos tubos de escape, é responsável pelo aumento da mortalidade, sendo a mortalidade cardiovascular prematura, causada pelo dióxido de enxofre. Em Paris, por exemplo, são registadas mais de 300 mortes anuais.
Quarta: cada candidato terá tido acesso a pelo menos um dos vários estudos e inquéritos sobre transportes públicos realizados na última década em Lisboa. Assim sendo, ser-lhes-á fácil constatar que um em cada três portugueses (33 por cento) é peremptório ao afirmar que em circunstância alguma está disposto a abdicar desse privilégio que é andar diariamente num vaivém de longas filas de trânsito e engarrafamentos, conduzindo a sua viatura.
Se acrescentarem a este número os 12 por cento que manifestam impossibilidade temporária (não definida) para abdicarem do carrinho, concluirão que quase metade dos lisboetas está definitiva, ou temporariamente, “indisponível” para se deslocar em transportes públicos.
Esta percentagem já seria suficiente para pensar duas vezes sobre a necessidade de dar prioridade à melhoria dos transportes públicos, em detrimento de medidas restritivas à circulação automóvel. No entanto, qualquer cidadão mais perspicaz juntará mais dois elementos importantes.
Num estudo encomendado pelo governo ao ISCTE, em 2001, pode ler-se o seguinte:
“...as razões invocadas para a não utilização do transporte público não se prendem directamente com a qualidade do serviço disponível, mas tão só com a preferência pelo uso do transporte privado. (...) não existe uma relação directa entre a qualidade percepcionada do transporte e a tendência para o seu uso, pelo que não será suficiente aumentar a qualidade do transporte público para que aumente, automaticamente, a procura deste tipo de transporte.”
O mesmo estudo conclui que “não existem diferenças entre os inquiridos que utilizam transportes (públicos) e aqueles que não os utilizam” e que “apenas 11% dos não utilizadores e 13% dos utilizadores percepcionam os transportes públicos como estando piores que há 3 ou 4 anos atrás”.
Haverá algum estudo mais esclarecedor, do que este encomendado pelo governo?

Quinta: chegou a altura de Lisboa estabelecer um cotejo com as grandes cidades europeias em termos de qualidade de vida ambiental, restringindo a circulação automóvel. A necessidade é ainda mais imperiosa, porque Portugal terá de cumprir a directiva comunitária sobre a “qualidade do Ar”, sob pena de se sujeitar a sanções impostas por Bruxelas.
Sexta: anualmente, aumentam os dias em que são ultrapassados os valores máximos de concentração de ozono na atmosfera (180 microgramas por metro cúbico), sendo frequente encontrar valores na ordem dos 225 microgramas.
Sétima: com o aumento do tráfego rodoviário, provocado pela construção da ponte Chelas/Barreiro, a concentração de ozono elevar-se-á a níveis insustentáveis, nomeadamente nos meses de Verão e o trânsito será caótico.

Resta saber se haverá algum candidato à presidência da Câmara de Lisboa, em 2009, disposto a dizer a verdade, ou todos vão continuar a apostar nas promessas vagas. Acredito que o candidato que souber explicar claramente porque vai introduzir portagens em Lisboa poderá ganhar vantagem na corrida. Se nenhum o fizer, os lisboetas vão sofrer as consequências.
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4 comentários

  • Vivo no Lumiar e utilizo o metro, Daniel Quando estou na Linha, utilizo comboio e metro.
    Nos transportes da periferia há bom e mau ( refiro-me aos autocarros, claro) embora concorde que são masi os maus que os bons.
    É verdade que 6 das premissas estão relacionadas com a poluição ( mas esse é o gravíssimo problema do excesso de tráfego automóvel...) mas não se podem reduzir a uma, porque se trata de questões diferentes, com soluções diversas.
    Quanto a dar condições às pessoas e aos melhores transportes, o estudo que cito parece-me elucidativo. E o estudo do LNEC também me parece importante, já agora...
    Também vivi em Londres, quatro anos, e não andava de carro na cidade. Aliás, utilizava também transportes em Estocolmo, Roma, Genève e Split, cidades europeias onde vivi. E Roma e Split não são bons exemplos de transortes públicos agradáveis.
    Abraço
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    Daniel Reis 05.05.2009

    Carlos, felicito-o pela coerência na defesa do uso de transportes públicos e praticar o que prega no seu dia a dia!

    Pelo que me diz, felizmente conhece as realidades da restante Europa. Não acha então que apenas portajar, sem fazer nada do que mencionei acima não é uma questão redutora? Os benefícios seriam assim tantos?

    Para mim, existe tanto que pode ser feito, antes de seguir apenas mais um meio do Estado meter a mão no bolso do contribuinte. Se não existirem condições nos transportes públicos, continuar-se-á a usar meios de transporte privado, com as consequências que bem elencou.
    Portajar é, para mim, uma questão secundária. Fazendo da nelhoria do sistema de transportes, uma questão prévia.

    Abraço

  • Claro que concordo, Daniel. Portajar, apenas, é uma medida com reduzidos efeitos práticos. É necessário que seja acompanhada de medidas complementares, como aonteceu em Londres.
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