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Delito de Opinião

Tese (contra-a-corrente) para animar uma cidade

J.M. Coutinho Ribeiro, 04.05.09

O retrato de Lisboa que Pedro Correia traça abaixo não é um exclusivo da capital - passa-se o mesmo em todas as nossas grandes cidades. Há quem garanta que a forma de inverter a desertificação dos centros urbanos passa por dificultar o acesso automóvel. Discordo - os centros urbanos precisam é de mais automóveis. Mas antes que desatem a gritar de indignação, permitam-me que explique a tese.

Os grandes centros urbanos foram construídos numa altura em que não havia automóveis. Logo, as habitações foram construídas sem garagens. Hoje, praticamente, todos têm automóveis e, por não terem onde guardá-los, os habitantes dos centros rumaram à periferia, onde as casas têm garagens, com elevadores quase directos para as suas habitações, permitindo transportar confortavelmente as suas compras que confortavelmente adquiriram em confortáveis centros comerciais, com escadas rolantes e parqueamento gratuito. No entanto, muitas destas pessoas que se deslocaram para a periferia continuam a trabalhar nos centro da cidade e, por isso, vêem-se obrigadas - ou habituadas - a ir trabalhar de automóvel, entupindo as ruas, pagando preços exorbitantes pelo estacionamento, porque, entretanto, tiveram que deixar os filhos na escola, tudo muito pouco compatível com os transportes colectivos.

Vejamos um exemplo: eu trabalho na Baixa do Porto e vivo em Gaia, junto à Ponte da Arrábida, onde há autocarros, mas não há Metro. Logo, sou um dos muitos que todos os dias se deslocam de automóvel para a Baixa, até porque nunca sei se vou precisar dele para uma deslocação não prevista.

Ora, se na Baixa do Porto houvesse habitações com garagem, haveria cafés abertos até tarde, esplanadas e estabelecimentos com horário de centro comercial e, por certo há já muito viveria perto do meu escritório. E, aí, no dia-a-dia, circularia a pé entre casa e o escritório. E, aí, seria um dos muitos milhares que ao fim do dia daria vida a artérias que, agora, são desertas, com os seus cafés fechados e com a sua insegurança.

Entendamo-nos, pois: a ideia não é tirar os automóveis da baixa - a ideia é que a reabilitação urbana arranje forma de criar condições para que os automóveis possam estar lá e não precisem de ser utilizados. Os quintais abandonados no miolo dos quarteirões permitem criar as garagens que tornariam os centros muito mais apetecíveis. 

E convém andar depressa, antes que os escritórios e os estabelecimentos sejam obrigados a fechar por falta de clientela e porque é desconfortável ir ao centro da cidade. E, então, nem automóveis, nem pessoas - apenas um imenso deserto a qualquer hora do dia.

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