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Delito de Opinião

O país auto-imune

Teresa Ribeiro, 09.09.12

Vejo na televisão uma reportagem sobre jovens enfermeiros que se preparam para fazer as malas e deixar o país, talvez para sempre, e vem-me à memória uma frase (agora muito) batida: "Os melhores são os que saem". Ninguém a contesta, porque não só reflecte a opinião que temos acerca dos que emigram, como do país que os leva a emigrar.

Portugal é um país auto-imune, cujo povo mal tratado criou uma imagem de si tão reles que provoca a perplexidade nos forasteiros. Não sei quando teremos forjado sentimentos nacionalistas mais empenhados em proclamar a nossa inépcia que as obras valerosas que nos foram da lei da morte libertando, o que sei é que as páginas mais gloriosas deste país se escreveram quando nos fizémos ao mundo, excretados pela mesma nação valente que deu um pontapé no traseiro dos emigrantes que zarparam daqui para fora nos anos sessenta. Ou seja, o melhor da nossa História é uma história de exclusão.

Agora voltamos ao mesmo. E tal como em criança ouvia os mais velhos apontar os portugueses bem sucedidos no estrangeiro como o exemplo de que afinal até somos bons, não tarda voltarei a escutar como um fado a mesma narrativa e a meditar sobre essa alquimia de fronteira, que transforma tugas desvalidos em gente de sucesso.

Os que saem até podem ser fantásticos, mas se não conseguirem fazer carreira num sistema que funcione, de pouco lhes servirá o talento. O sistema, essa abstracção, é criado pelas elites. São elas a chave dos estudos comparados entre nações. Elites. Em Portugal o que temos?

"Parece-me óbvio que há uma falta de empresários, de capitalistas. Será um problema ancestral? Vem da nossa maneira passada de viver e de gastar? Dos desperdícios? Do facto de os ricos portugueses terem vivido à sombra do Estado durante 200, 300 ou 400 anos? De o Estado ter ocupado tudo desde os Descobrimentos? Não quero ir por aí, mas o resultado é este. Há poucos empresários, poucos capitalistas com capitais, as elites são fracas e têm uma noção medíocre do serviço público. É raríssimo encontrar ricos, poderosos, famílias antigas, com um sentimento forte do contributo que podem dar à sociedade", reflectia António Barreto em 2009, numa entrevista concedida ao jornal i.

Desactualizou? Nada. Nessa entrevista falava também de iliteracia, da inoperância da justiça e a propósito referia: "Há 20 anos os magistrados vinham em primeiro lugar, era o grupo profissional que mais confiança merecia dos portugueses. Estão hoje em penúltimo lugar; abaixo só os deputados".

Três anos passam a correr. O retrato desta plataforma triste de onde se pode ver o futuro apenas por um óculo, mantém-se mais actual que nunca.
 

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