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Delito de Opinião

Egoísmos e lições inúteis vindas do frio

José António Abreu, 03.09.12

As causas.

Bancos subprovisionados e, em boa medida devido à existência de incentivos fiscais, concedendo demasiado crédito (a taxa de crescimento atingiu quase 50% em 1988); boom no sector imobiliário; queda nas exportações (em parte resultado da desintegração da União Soviética, em parte de uma moeda excessivamente forte); resistência à implementação de reformas.

 

Os efeitos.

Em 1991, o PIB caiu 6,5% e, entre 1991 e 1993, mais de 10%. Cortes na despesa (dos sectores privado e público) fizeram subir a taxa de desemprego para quase 18%. Os bancos foram salvos pelo governo, o que representou um custo fiscal líquido (isto é, já consideradas as receitas da venda das participações) de 5,3% (em relação ao PIB de 1997). O crédito tornou-se muito mais difícil (em dois anos consecutivos, a queda no montante concedido foi na ordem dos 10%) e, no final da década, após as reprivatizações, o sistema bancário encontrava-se substancialmente alterado: os bancos de poupança haviam desaparecido, dois grandes bancos comerciais tinham-se unido e sessenta por cento das instituições financeiras eram controladas por capital estrangeiro.

 

O local.

A Finlândia, essa terra de gente egoísta que não quer ajudar a pagar as nossas dívidas. De gente que se meteu no buraco sozinha e se extraiu dele sem o nosso dinheiro (o qual, nem se questiona, teríamos tido todo o prazer em emprestar). Que – quão estranho! – parece ter aprendido com os erros.

 

A aprendizagem.

Em 2008, ano do início da crise do subprime, a Finlândia tinha um excedente orçamental de 5,3%. Em 2009, ainda tinha um excedente de 4,3%. Em 2010 e 2011, quando o défice português rondava os 10% (após décadas sem passar para o lado positivo da escala), teve défices de 2,5%. Este ano, deverá apresentar um défice de 0,5%.

Em 2009, a Finlândia tinha uma dívida pública de 33,9% do PIB, a qual subiu para 43,5% em 2010 e para 48,4% em 2011, prevendo-se que fique este ano por valores similares. A nossa era de 71,6% em 2009, de 83,1% em 2010 e aproxima-se alegremente dos 110%.

(Antes que alguém mencione a Nokia, refira-se que, embora o crescimento da empresa tenha ajudado a Finlândia a sair da crise, vão longe os tempos em que ela representava 4% do PIB; hoje não chega a 1%.)

 

Os egoísmos.

Depois de passarem por estas dificuldades (relembre-se: eles sabem o que é uma taxa de desemprego de 18% e uma queda no PIB de 6,5%), tendo compreendido (pelo menos até ver) os benefícios da disciplina orçamental (Portugal encontra-se sob intervenção externa pela terceira vez em pouco mais de três décadas mas muitos portugueses, incluindo quase todos os políticos, continuam a recusá-los), estando conscientes de um grave problema de envelhecimento da população, o qual vai exigir recursos significativos a curto/médio prazo, é assim tão estranho que aos finlandeses não agrade a hipótese de terem de pagar os défices dos países do Sul? Claro que sim. Para gregos, portugueses, espanhóis, italianos, tudo isto é irrelevante. Importa apenas o curto prazo; a circunstância de existirem países com alguma margem orçamental e países à beira da falência onde se deseja evitar a austeridade. Fala-se, pois, em egoísmo – dos primeiros. Por exemplo, fala em egoísmo o Presidente da República Portuguesa, no meio de um apelo ao BCE para que ignore as opiniões dos recalcitrantes e avance para decisões por maioria. Tão fácil, dispor do dinheiro alheio. Mas talvez Cavaco venha a obter mais do que deseja. Talvez um destes dias constate, e todos nós com ele, que a maioria pró-intervenção no BCE se transformou em unanimidade. Acontecerá logo após a Finlândia, a Alemanha, a Holanda, a Áustria, o Luxemburgo – enfim, os «minoritários» – abandonarem o euro. O que, no fundo, constituirá um alívio: quem gosta da companhia de egoístas?

 

(Dados retirados daqui e daqui.)

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