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Delito de Opinião

121 A.D.

José Navarro de Andrade, 08.08.12

 Paul Strand, "Wall Street", 1915

 NOAA, "Relâmpagos sobre Boston", 1967

 

Ao relatar a morte de Calígula, Suetónio escreve como quem abana a cabeça em sinal de consternação. Gaius – Calígula foi o amável epíteto que lhe atribuíram os soldados de seu pai – demonstrou toda a sua imprudência ao ignorar os sinais evidentes de perigo que os deuses lhe comunicaram. No dia do seu assassinato, ao degolar em sacrifício um par de flamingos, o sangue espirrou-lhe na toga, na véspera, um raio fulminou Roma, e houve mesmo quem visse um cometa riscar os céus, poucos dias antes de à saída de um espetáculo de gladiadores, meia dúzia de tribunos, acolitados por um centurião, terem cravejado o corpo de Gaius à punhalada. Esta morte abjecta, confirma Suetónio, deveu-a Calígula a si próprio, graças à temeridade, à impiedade, à estupidez mesmo, que exibiu perante os presságios.

Os deuses romanos queriam bem à humanidade, intervindo amiúde no seu curso com benevolência e amparo. Em troca só pediam respeito, venerado com oferendas de sangue. Não eram como aquela identidade remota e inapelável dos cristãos, uma seita fremente e carrancuda, estranhamente influenciada pela superstição judaica. O deus deles só se exprimia através de catástrofes e castigos, assim patenteando o seu desprezo pelos homens.

Estaremos assim tão longe destes tempos e destas crenças, quando discutimos da maneira como o fazemos as supostas fórmulas económicas que nos salvarão da crise abissal para onde forças intangíveis e enigmáticas nos empurraram?

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