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Delito de Opinião

Verão quente

Rui Rocha, 18.07.12

É lamentável que o espaço de oposição ao governo esteja a ser ocupado por D. Januário Torgal Ferreira e por Mário Soares. E isto é assim pelas pessoas em si, pelo que representam e pelo tipo de discurso que protagonizam. A democracia deve ser o espaço da solução e da sua alternativa. Ora, o bispo das Forças Armadas e o ex-presidente não são solução para o que quer que seja. E muito menos estão em condições de apresentar qualquer alternativa. 

 

Mário Soares é um político reformado e irreformável, dono de algumas poucas virtudes sobrevalorizadas pelo próprio, às quais uma parte significativa dos portugueses foi sensível numa determinada fase e a que se tornou indiferente depois, e de um conjunto razoável de vícios que são, em boa medida, partilhados pelo próprio sistema (o amiguismo, a ideologia balofa, o empurrar os problemas com as bochechas, etc.). Por seu lado, D. Januário acumula, ironicamente, a condição de representante de duas instituições, o Exército e a Igreja,  que enquanto tais e tal como acontece com os árbitros no futebol, são tanto mais úteis ao país quanto menos se notar a sua presença em campo. Para além disto, o discurso de um e de outro constituem o exemplo acabado do mais profundo espírito anti-democrático.

 

O problema essencial das afirmações de D. Januário não é o de ele ser bispo ou major e de nessa qualidade, ou na de simples cidadão, criticar o governo. É de apostar em acusações gravíssimas, generalizadas a um órgão de soberania democraticamente eleito e de não as fundamentar. Com tal comportamento, ofende, antes de mais, os portugueses. A raiva e o excesso quando se aliam à vacuidade não só não atingem o alvo a que se dirigiam, como retiram credibilidade a quem profere as acusações. No mesmo plano se colocou Mário Soares. Defender que os portugueses querem um novo governo revela, antes de mais, a ambição de falar em nome de quem já não lhe reconhece autoridade para isso. Para além do mais, trata-se mais da expressão de um desejo do que do diagnóstico da realidade. Excesso e falta de sustentação de afirmações que só não surpreendem porque ao contrário do próprio, já todos percebemos que o papel político de Mário Soares é meramente decorativo.

 

O problema deste estado de coisas é que o país precisa de oposição ao governo. Forte, credível, sustentada, com propostas que possam constituir-se como alternativa. Com D. Januário e Mário Soares a ocupar o espaço mediático não é só o discurso populista ou radical de Louçã e Jerónimo que perdem palco e oportunidade. É também a incapacidade de Seguro se afirmar como alternativa moderada que se torna mais evidente. Tudo em benefício de um governo que se encontrava há uns dias atrás em grandes dificuldades e com acelerado desgaste e que pode, agora, respirar um pouco e até apresentar-se como vítima de ataques desvairados, com isso reforçando a credibilidade da tese da conspiração de interesses. Repito, tudo em benefício de um governo que estava contra as cordas, mas não necessariamente em benefício do interesse do país.

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