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Delito de Opinião

Um acto de cidadania

Pedro Correia, 24.06.12

A crise e o chamado "acordo ortográfico", conjugadamente, relançaram o circuito de venda de livros usados. Há cada vez mais procura desses livros entre nós. Por isso, e também para sacar uns cobres fáceis, herdeiros vendem a peso bibliotecas inteiras de pais e avós. Invoco, a título de exemplo, um escritor de que gosto muito: Vergílio Ferreira. Ainda há pouco descobri uma primeira edição do romance-chave deste escritor, Aparição (com data de 1959) por apenas cinco euros. Quem vende ao desbarato nem faz ideia do que está a vender: só quer ter o dinheiro na mão, tão cedo quanto possível. E alguns alfarrabistas de circunstância que fazem essas compras por atacado também não: só querem revender os livros, quanto mais cedo melhor. Recusar ler na grafia analfabetizante adoptada nos últimos meses pela generalidade dos editores nacionais é um acto de cidadania. Não o sugiro a ninguém, não critico quem procede de maneira diferente, mas imponho-o a mim próprio.
Há milhares e milhares de livros disponíveis em 'fundos de armazém' que vêm agora à superfície nas livrarias, ao encontro de leitores como eu, que preferem a "antiga" ortografia e estão disponíveis para adquirir essas obras impressas numa escrita sem erros. Certas livrarias têm já secções específicas para livros destes, pensando precisamente nos portugueses que recusam o "acordo".
Sinto-me bem acompanhado - por jornalistas, tradutores, professores. Por editores como Nelson de Matos, Manuel S. Fonseca, Guilherme Valente, Francisco Vale, Zita Seabra e Manuel Alberto Valente. E por alguns dos nossos melhores escritores, pensadores, ensaístas e críticos - António Lobo Antunes, Manuel Alegre, Óscar Lopes, Mário de Carvalho, Manuel António Pina, Vasco Graça Moura, Pedro Tamen, Nuno Júdice, Eduardo Lourenço, Alice Vieira, Mário Cláudio, Eugénio Lisboa, Manuel Gusmão, António Emiliano, Baptista-Bastos, Miguel Esteves Cardoso, José Manuel Mendes, Gonçalo M. Tavares, Teolinda Gersão, Inês Pedrosa, Miguel Sousa Tavares, José Rentes de Carvalho, Gastão Cruz, Luísa Costa Gomes, Maria Alzira Seixo, José Gil, Maria Teresa Horta, Maria Velho da Costa, Luísa Dacosta, Pedro Mexia, Ana Luísa Amaral, Fernando Venâncio, Helena Buescu, Fernando Pinto do Amaral, José Riço Direitinho, Desidério Murcho, Anselmo Borges, Rui Ramos, Vasco Pulido Valente, Vítor Aguiar e Silva, Maria do Rosário PedreiraRita Ferro, Teresa Salema, Casimiro de Brito, José Mário Silva, Helena Barbas, António Guerreiro  - pensam como eu.

Maria Lúcia Lepecki, Vitorino Magalhães Godinho e João Bénard da Costa, infelizmente já falecidos, eram também anti-acordo. No passado dia 2, ouvi o mais célebre escritor moçambicano, Mia Couto, dizer claramente em entrevista à SIC Notícias: «Não sou adepto do acordo ortográfico.»

Palavras que naturalmente aplaudo. Porque são um acto de cidadania também.

 

NOTA: acrescentei vários nomes à lista inicial

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