Uma história como tantas outras
Depois de tantas dúvidas, simulações neste e naquele banco, contas e mais contas, lá se decidiram a comprar a casa. Não era a ideal mas era a possível. Não tinha vista para o mar mas até conseguiam ver a auto-estrada passar lá ao fundo. Teriam preferido ficar mais perto dos pais mas os preços ali sempre eram mais baixos. O prédio tinha 9 andares e em cada um deles havia 5 casas. Habituados aos pequenos prédios onde tinham crescido, ao princípio estranharam. Mas, ao longo dos anos, aprenderam a reconhecer as caras dos vizinhos com quem se cruzavam nos elevadores. Entretanto vieram os filhos. Ao fim de algum tempo esta era a sua casa.
Mas eis que as dificuldades económicas chegaram. Alguns dos vizinhos venderam as casas, outros arrendaram-nas. Começaram as faltas de pagamento dos valores acordados por todos. Por serem mais graves, algumas deram origem a processos no tribunal que aguardam resolução. A gestão do condomínio tornou-se mais difícil. Por isso ninguém estranhou muito quando um dos dois elevadores avariou e deixou de funcionar. O outro lá ia cumprindo a sua função. Mas, há umas semanas atrás, também esse teve uma avaria e, sem solução à vista, as escadas são a única solução. Com humor, dizem aos amigos que, agora sim, fazem exercício a valer e que se morassem no nono andar seria pior. Sabem que para os vizinhos com filhos pequeninos é bem mais difícil. Mas custa-lhes aceitar que os colegas dos miúdos já não vão brincar lá a casa quando saem da escola. E os seus pais deixaram de os visitar pois subir ao sétimo andar não é fácil na sua idade.
E não é o facto de terem de subir e descer aquelas escadas que os atormenta mas o facto de estarem presos numa situação que não tem fim à vista. Agora quando pensam na sua casa vêem-na como uma ilha difícil de alcançar e, ao mesmo tempo, impossível de deixar.
O elevador fora de serviço é, afinal, uma boa metáfora.