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Delito de Opinião

Quem se vê na TV (13)

João Carvalho, 23.04.09

Os profissionais da identidade difícil

Temos aqui um grupo de jornalistas muito curioso e que nem é exclusivo das televisões. Os profissionais da identidade difícil também estão nas rádios e nos jornais e são em número cada vez maior.
Este grupo surgiu há alguns anos e são os mais novos, os recém-chegados à profissão, que têm tendência para aderir. Não se percebe a vantagem, mas a verdade é que estão a aumentar.
Vem a propósito um caso de que estou a lembrar-me. Há uns anos, um conhecido jornalista aparecia de quando em vez nos telejornais da RTP2 (salvo erro) para uns comentários esporádicos (não me lembro se generalistas ou especializados). Na primeira linha do rodapé aparecia o nome dele e, na segunda linha, em letra de corpo inferior, a profissão. O que se lia era
José da Silva                                                                                                                                      
Jornalista                                                                                                                                            
e recordo-me de dar comigo a pensar — com um toque de ironia, mas sem maldade — que quase valia a pena fazer a troca: Jornalista, primeiro, e José da Silva, em letra mais pequena, depois. Com efeito, vinha-me sempre à cabeça que era menos vulgar ser jornalista do que ser José da Silva.
Em certa medida, admirava-o pelo nome profissional que usava, porque é provável que ele tivesse mais nomes entre José e Silva, mas não sentira a necessidade ou a tentação de fazer outro ajuntamento mais personalizado. Deixou ficar simples o que deve ser simples.
Ora, os profissionais da identidade difícil estão exactamente nos antípodas do José da Silva. Só nunca saberemos o que os move.
A gente entende que há sobrenomes indissociáveis por tradição: Sotto Mayor, Eça de Queiroz, Castelo Branco, Corte Real, etc. A gente entende e aceita-os com naturalidade. Também se aceitam as junções que ajudam a personalizar o nome profissional e que não só soam bem juntos como também são fáceis de pronunciar: Mesquita Nunes, Barbosa de Oliveira, Ferreira de Almeida, Coutinho Ribeiro, Gomes André, Reis Figueira e outros.
O que não se percebe é o que leva alguns a decidir-se por nomes profissionais como Alberta Marques Fernandes, Frederico Mendes Oliveira, Afonso Azevedo Neves, Tiago Azevedo Fernandes, Tiago Mota Saraiva, Rogério da Costa Pereira, etc., entre muitos exemplos possíveis (mas impossíveis de recordar), cheios de sílabas, difíceis de pronunciar e com proveito duvidoso. Se é para as pessoas não se lembrarem do nome deles, então conseguem-no: é mais fácil dizer «aquela jornalista que tem a mania que é boa e que dá sempre uns pontapés na gramática» ou «aquele repórter que segura o microfone com as pontas dos dedos como se fosse a Teresa Salgueiro no Coliseu».
Tenho para mim que não vem longe o dia em que as reportagens dos profissionais da identidade difícil irão terminar assim: (…) com imagem de Rui Pinto, do Aeroporto de Alcochete para as notícias das 8, Américo Henrique Teixeira Pinheiro da Silveira...

 

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