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Delito de Opinião

Pontos nos is (15)

João Carvalho, 29.04.12

LIMITES

I

Um juiz do tribunal de Portalegre «entendeu que a entrega da casa ao banco liquida toda a dívida do empréstimo do crédito à habitação», o que contraria o hábito instalado na banca de ainda exigir amplas responsabilidades aos exaustos devedores hipotecados.

Vai daí, a Associação Sindical dos Juízes Portugueses (ASJP) veio a público considerar que «a decisão do Tribunal de Portalegre, sobre uma casa entregue ao banco, prova que os juízes se sabem adaptar às novas realidades do País». Disse a ASJP: "É uma decisão nova que se aplica num tempo novo. É importante que a jurisprudência e as decisões dos tribunais se adaptem à realidade que nós temos."

II

Uma vez mais, a ASJP ultrapassou os limites e fez letra-morta da independência dos juízes, que não obedecem a qualquer hierarquia no seu exercício de julgar, e da sua respectiva irresponsabilidade no que respeita à sua competência decisória.

Que um cidadão opine sobre decisões de tribunais é um direito corrente. Que um dirigente da ASJP e juiz faça o mesmo já é mais duvidoso, por se tratar de um magistrado judicial a comentar decisões que lhe são alheias por pertencerem a processos entregues a outros magistrados judiciais. Que um magistrado judicial o faça em nome da ASJP é claramente abusivo.

Por este caminho e por absurdo, a ASJP parece querer passar a tecer considerações sobre todas as decisões de todos os tribunais judiciais ou, pelo menos, sobre aquelas que puderem fazer jurisprudência. A menos que a notícia, tal como tem estado a ser divulgada, esteja incorrecta e, nesse caso, a ASJP já teve muito tempo para correr a corrigi-la.

III

Curioso é ninguém, por uma vez, restabelecer os limites que a ASJP não consegue respeitar. Está mais do que provado o que sempre achei (e muitos juízes também, felizmente): tentar juntar conceitos de associativismo profissional com posições de organização sindical é uma enorme confusão que devia manter-se bem longe dos respeitáveis limites dos órgãos de soberania.

Ser membro de um órgão de soberania às segundas, quartas e sextas e sindicalista às terças, quintas e sábados não augura nada de bom — nem aos domingos, porque a Justiça não encerra.

2 comentários

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    c. 30.04.2012

    Referendo entre a classe? Qual referendo, qual classe!
    Os senhores juiz exercem o cargo tal como ele é desenhado pela Lei. Se não concorda,, demitem-se. Se querem fazer política, demitem-se e integram um partido ou fundam outro e apresentam-se a eleições. Os juízes não têm de estar, como estão, em autogestão. Nas democracias avançadas não acontece tal.
    O poder judicial consiste na faculdade de uma situação de litígio ser resolvida de acordo com a Lei e não por conveniência do executivo. Para tal não é necessário um décimo do que aqui se pede pata os juízes. Em Inglaterra, uma democracia avançada, a Pátria da Magna Carta e do habeas corpus (inexistente em França...), que não conhece ditaduras há 350 anos, 75% das acções são julgadas por voluntários, não pagos, e a quem é pedido bom senso, firmeza e conhecimento do local.
    Interessante, não é?
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