Em dia de livro
Não deve ter sido a melhor ideia do mundo ler o Guerra e Paz aos 13 anos mal feitos. Os Guerra ainda não tinham chegado e a tradução devia ser péssima. A minha adolescente cabeça também, claro. Aprendi a ler muito cedo e, por isso, cheguei rapidamente aos livros. Comecei pelas aventuras exóticas e pelos policiais da Agatha Christie e um dia, ao abrir o Mar Morto de Jorge Amado, li: Pastoreávamos a noite como se ela fosse um bando de irrequietas virgens na idade do homem. Pensei que devia haver vida para além do crime e peguei nos primeiros volumes que estavam à mão na estante. Era o Guerra Paz ou, pelo menos, coisa que se assemelhava. Não parei deste então. Fui andando pela estante de casa e por outras estantes e li tudo em que consegui pôr os olhos. Quando cheguei à faculdade, tinha no currículo de leitora, para além dos portugueses, os franceses, os russos, os ingleses do séc. XIX, os americanos. Continuei, compulsiva, insistente, fui descobrindo autores e redescobrindo outros. Quando me perguntam como se leva um jovem a gostar de ler, respondo sempre que não sei. Gostar de ler é uma graça que se recebe. A minha leitura do Guerra e Paz não foi, decerto, a melhor leitura, tanto que tive de voltar ao texto muitos anos depois. Mas foi lá que aprendi que os livros são a pátria comum dos homens. Nem sempre de leite e mel, mas de inesgotáveis territórios.