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Delito de Opinião

Um caso pessoal a propósito da legislação sobre o enriquecimento ilícito

Rui Rocha, 17.02.12

Em finais de 2002 tornei-me gerente de uma sociedade. Nunca participei em qualquer acto de gestão. A situação constitui uma mera gerência de direito (ou de favor). Em Mar/2003, renunciei à dita gerência de direito. Antes dessa data não tive qualquer ligação efectiva à sociedade. Depois, perdi-lhe completamente o rasto. Em Dez/2009, as Finanças notificaram a intenção de me responsabilizar por dívidas da sociedade (reversão relativa ao período de 2003 a 2006 - cerca de 20.000€). Apresentei defesa. Em Fev/2010 fui notificado de que a reversão tinha sido decretada. Qualquer acto da Administração deve ser fundamentado e ter em conta os argumentos apresentados pelo contribuinte. Essa obrigação tem ainda mais pertinência quando, como era o caso, o ónus da prova é da Administração. O despacho em causa não estava fundamentado nem se pronunciava sobre nenhum dos pontos que tinha invocado. Perante tal decisão, apresentei em Fev/2010 uma Oposição à Execução no Tribunal competente.  Nestes processos, o Estado pode penhorar de imediato o contribuinte. A única maneira de paralisar a penhora é apresentar uma garantia (caução, etc.). A prestação de garantia exige que o contribuinte tenha recursos no valor da quantia em execução e implica custos (comissões bancárias, etc.). Não prestei qualquer garantia. A penhora ocorreu 14 meses depois. A situação era tão simples que o Juiz entendeu prescindir da audição de testemunhas e nem sequer proferiu sentença formal. O caso foi decidido no saneador (peça preliminar do processo). A decisão foi-me favorável.  Mesmo assim, o Tribunal demorou mais de 18 meses a pronunciar-se. A decisão transitou em julgado em Nov/2011. Apesar de todas as tentativas que fiz, o meu salário de Novembro ainda foi penhorado. Mais, em início de Dezembro, recebi uma notificação em que o Fisco informava que o valor da penhora do meu salário seria duplicado. Passei o mês de Dezembro em contacto com as Finanças para que fosse levantada a penhora inicial e a nova penhora. Contactada, a Senhora representante da Fazenda Pública informou-me, com fleuma e circunstância, de que tudo seria tratado a seu tempo. In extremis, o salário de Dezembro salvou-se. Elaborei todas as peças processuais. Caso contrário, teria despendido com advogados, no mínimo, 5.000€. Mais de 300€ de custas não serão devolvidos. O Estado tem ainda em seu poder mais de 4.000€ correspondentes às penhoras efectuadas. Não sei quando serão devolvidos. Estes valores poderiam ter sido a diferença entre pagar ou não o crédito ou a renda da habitação, o empréstimo automóvel, a escola dos filhos ou comprar bens alimentares. Felizmente, não foram. Este meu caso não é, certamente, dos mais graves em termos de valor, demora, ou padrão de actuação. Mas dá que pensar. É a esta Administração Fiscal e a esta Justiça Tributária que estão a entregar novos poderes?

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