Saltar para: Post [1], Comentários [2], Pesquisa e Arquivos [3]

Delito de Opinião

Pouca-terra

João Campos, 27.12.11

Diz o Daniel Oliveira no Expresso:

Quem defende a inevitabilidade da lei do mais forte só tem de aguentar. Não gostam da luta dos maquinistas? Aprendam a conduzir comboios.

 

A escola argumentativa do Bloco deve realmente ser fascinante, mas deixemos isso de lado por agora. A "luta" dos maquinistas foi em 2011 o calvário de milhares de portugueses. Houve mesmo algum mês em que os maquinistas não tenham feito greve? Note-se que o problema não é o direito à greve, é o abuso da greve, que neste caso em particular já passou há muito tempo todos os limites do ridículo. Se a lei prevê o direito à greve, também prevê a existência de serviços mínimos, coisa que os maquinistas nunca se preocupam em assegurar devidamente. Exemplo mais recente: no dia 23, houve um comboio no sentido Lisboa - Faro, e outro no sentido inverso. Mas nos dias 24 e 25 não houve um - um - comboio de longo curso a circular a Sul do Tejo (devem ser amigos do Mário Lino, os maquinistas). E no dia 26, quando supostamente já devia ter terminado a greve, apenas houve um comboio dos três previstos no sentido Faro - Lisboa. Naturalmente, estou a partir do princípio de que o Alentejo e o Algarve são regiões dignas de ter serviços mínimos, mas o mais certo é estar enganado.


Voltando à frase do Daniel Oliveira. No meu caso, e no caso de muita gente, não gostar da luta dos maquinistas (não é isso que está em causa, mas vá) não significa aprender a conduzir comboios (mesmo que o quisesse fazer, quem seria despedido para eu ter trabalho?), mas sim ser forçado a optar por transportadoras rodoviárias privadas. Foi o que tive de fazer para poder passar o Natal com a família e regressar a Lisboa a tempo de trabalhar na Segunda-feira. E não terei certamente sido o único. Podendo escolher entre o autocarro e o comboio, não hesito - antes o comboio, mil vezes o comboio. Mas a CP, com os seus especialistas em criar horários que não servem ninguém e eliminar horários que são realmente úteis (como os últimos Intercidades do dia para o Sul), já consegue por si só prestar um péssimo serviço às populações; com as suas greves constantes, os maquinistas só contribuem ainda mais para o mau serviço da CP, levando mais e mais gente a optar por o transporte rodoviário, público ou particular. É bom de ver onde isto vai acabar, mais cedo ou mais tarde.

A ironia é que, mais dia menos dia, com mais greve e menos comboio, a CP estoira de vez, e os maquinistas - estes mesmos que boicotaram o Natal de milhares de pessoas e que passaram 2011 a transtornar a vida a milhões - ficam desempregados (pelo menos os de longo curso). Da minha parte, que desde miúdo adoro comboios e que não encontro meio de transporte que se compare ao velhinho pouca-terra (nem o carro), lamento que assim seja. No entanto, quando tal acontecer, que não se queixem os maquinistas: a cama onde se vão deitar também foi feita por eles. 

29 comentários

Comentar post