O manifesto "um novo rumo"
Mário Soares constitui seguramente a figura mais emblemática do regime saído do 25 de Abril. É por isso com tristeza que o vejo associar-se a uma iniciativa tão absurda como a deste manifesto. Estou totalmente em desacordo com a política financeira de Vítor Gaspar e aposto singelo contra dobrado que daqui a dois anos o país vai estar ainda pior do que está hoje. No entanto, a oposição pressupõe a afirmação de alternativas, não bastando a apresentação de um texto mal escrito, em estilo de redacção escolar, sem uma mínima proposta consistente.
Qual a razão do manifesto? A resposta é esta: "Não podemos assistir impávidos à escalada da anarquia financeira internacional e ao desmantelamento dos estados que colocam em causa a sobrevivência da União Europeia". Alguém percebe esta construção gramatical? Afinal são os estados que colocam em causa a sobrevivência da União Europeia? Ou é o seu desmantelamento?
Como é que se combate a crise? O manifesto dá a resposta: "Os signatários opõem-se a políticas de austeridade que acrescentem desemprego e recessão, sufocando a recuperação da economia". Qual é a alternativa? "Apelamos à participação política e cívica dos cidadãos que se revêem nestes ideais, e à sua mobilização na construção de um novo paradigma".
Há, no entanto, uma explicação singela para o manifesto. Como se pode ver aqui, em 1981, quando defrontou Salgado Zenha e o Secretariado, Mário Soares apresentou ao Congresso do seu partido uma noção intitulada "Novo rumo para o PS", tendo na altura arrasado os seus opositores internos. Trinta anos depois parece querer repetir o processo, atacando claramente a estratégia de António José Seguro. Daí a clara referência às "correntes trabalhistas, socialistas e sociais-democratas adeptas da 3ª via (…)" que "foram colonizadas na viragem do século pelo situacionismo neo-liberal". Este "novo rumo" é assim na verdade um reeditar trinta anos depois da moção "novo rumo para o PS". Não me parece é que António José Seguro esteja na disposição de ter o mesmo destino de Salgado Zenha.
Já em relação ao país, uma coisa tenho por certa. A actual política governamental é um desastre, mas este "novo rumo" não conduz a lugar nenhum.