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Silvio Berlusconi terá direito à sua página na história da Itália. Se o relato for justo, dirá dele que foi o empresário que arruinou o país enquanto aumentou sem cessar a sua fortuna e o seu poder pessoal. Esse que foi construído a partir do domínio dos meios de comunicação social, do magnetismo populista, da telegenia (dizem, vá lá saber-se...) e da informação privilegiada que detinha sobre os seus aliados e opositores que são, no fundo, tão corruptos e devassos como ele.
Em termos pessoais, atrás de Berlusconi é ainda possível ver um rasto de centenas de delitos que prescreveram ou passaram em claro, de julgamentos que nunca se realizaram ou que terminaram no meio de suspeitas mais do que fundadas de corrupção de testemunhas e juízes ou de leis alteradas no momento certo e à medida. Em termos globais, o seu contributo para o país que dirigiu foi uma política económica desastrada, uma dívida astronómica e, como não podia deixar de ser, um clima propício ao enraizamento da corrupção, da evasão fiscal, do clientelismo e das fidelidades ditadas pelas piores razões.
Apesar de cair nos paralelismos com personalidades históricas ser tentador (César, Nero, Mussolini ou padrinhos mafiosos), deve reconhecer-se que Berlusconi é um exemplar único e incomparável. Bobo, louco, exibicionista, sórdido, manipulador, incompetente, intriguista, ávido de poder, tudo isto são qualificativos que lhe assentam bem, mas que não descrevem integralmente a sua característica essencial de homem sem qualidades.
É este homem e a sua circunstância (permanência no poder, ou na sua órbita, ao longo de 20 anos) que deveriam merecer a nossa profunda reflexão. Outros preferirão salientar o funcionamento anti-democrático dos mercados ou do directório franco-alemão que sobrepõem a sua agenda ao resultado dos actos eleitorais de países soberanos e ao funcionamento das suas instituições. É uma questão pertinente. Mas, antes dessa, parece-me fundamental perceber como foi possível que democracias ditas avançadas tenham dado origem a lideranças como as de Sócrates, Jardim, Zapatero, Karamanlis, Papandreou e Berlusconi que levaram os seus povos a situações ruinosas e a uma degradação da vida pública e dos fundamentos do estado social. Não adianta reclamar das disfunções na vertente externa quando a nossa própria casa está a afundar-se às mãos de Burlesconis e Patusconis.