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Delito de Opinião

De Salazar a Kadhafi

Pedro Correia, 23.08.11

 

Escuto um daqueles programas destinados a "ouvir a voz do povo" num canal televisivo de notícias. O tema da tarde era a queda da ditadura líbia no preciso momento em que as forças da oposição irrompiam no bunker de Kadhafi, no centro de Trípoli, e se confirmava a conquista da capital após seis meses de sangrenta guerra civil.

Para meu espanto, nem uma só voz se ergueu em defesa dos combatentes anti-Kadhafi. Todas as opiniões exprimiam apoio explícito ou velado ao coronel que oprimiu a Líbia durante 42 anos.

Opiniões como estas:

«A Líbia é um paraíso. É um país como a Suíça, mas [os opositores] deram cabo dele.»

«Preocupa-me saber o que é que estes senhores [da oposição] vão fazer quando chegarem lá [ao poder].»

«Eu nunca estive na Líbia. Mas o que está em causa na Líbia é o dinheiro, é o petróleo.»

«Há duas semanas também houve violência na Inglaterra.»

«Não me venham falar em direitos humanos.»

«O que vão fazer ao Kadhafi? O mesmo que ao Saddam Hussein?»

Trinta e sete anos depois do 25 de Abril, chegámos a isto: queremos a democracia para nós enquanto toleramos e até aplaudimos a ditadura para os outros. Quem lamenta a queda de Kadhafi, pela mesma lógica, alinharia por Marcelo Caetano contra Salgueiro Maia.

«Não me venham falar em direitos humanos.» Uma frase que poderia ter sido proferida por Salazar, reeditada neste Portugal do século XXI. Como se a atracção pelos regimes de "pulso forte" estivesse inscrita no nosso código genético.

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