Um funeral e dois casamentos
José Sócrates está a afundar-se. Será, provavelmente, um momento doloroso. Para ele e para um ou outro apoiante incondicional. Temos pena. Pensando bem, nem por isso. Este é um processo que Sócrates deve enfrentar sozinho. Com toda a indignidade que corresponde ao caminho do desastre que ele próprio quis trilhar. Sabe-se que os náufragos, em desespero, podem arrastar para o fundo aqueles que se aproximarem. Sócrates antecipou-se. Submergiu o país antes de se afogar. Agora, enquanto segue o seu destino solitário, o pouco Portugal que resta não pode perder tempo a dar-lhe atenção. O tempo é dinheiro e há muito que Sócrates esgotou as reservas que permitiriam comprar uma bóia para lhe atirar. A emergência impõe agora duas prioridades para o país. Antes de mais, a constituição de um governo de mudança, com uma base tão abrangente quanto possível, integrado pelos melhores de entre nós ao nível técnico e político. Indispensável um casamento por interesse. Sendo que o interesse só pode ser o do país. A segunda é a renovação do PS, como força política fundamental na democracia portuguesa. Através de uma nova liderança que encerre, definitivamente, a página socrática. Inadiável um casamento por amor entre o aparelho socialista e uma proposta séria (por uma vez) que agite algumas bandeiras legítimas da esquerda. Visto pelo ângulo do PS, o Estado Social não pode continuar a ser o rebuçado que adoça a boca dos incautos como contrapartida pelo regabofe de boys e girls socialistas. É nestes tabuleiros que o futuro imediato, e não só, começa a jogar-se na noite eleitoral de 5 de Junho. Até lá, mais uns dias de foguetório nas ruas da campanha eleitoral. Aproveitemos então a fanfarra para, em festa, acompanharmos a caravana que faz as vezes de cortejo fúnebre de José Sócrates. Depois de 5 de Junho não vai sobrar tempo nem disposição para celebrar.