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Delito de Opinião

Diário irregular

Sérgio de Almeida Correia, 26.05.11

26 de Maio

 

Desconheço o que pensará o Prof. Catroga do facto do Dr. Passos Coelho ter trazido para a ribalta da campanha o tema, que eu pensava enterrado por uns tempos, da interrupção voluntária da gravidez. Em todo o caso, até sou capaz de compreender o ponto de vista do líder do PSD. Numa situação de emergência nacional, como é a que vivemos, a interrupção voluntária da gravidez deverá ser um tema caro ao FMI e aos nossos parceiros europeus. Naturalmente que o candidato faz depender uma mexida na lei de um novo referendo. Coisa baratucha, como se sabe, pois que para quem já deve tantos milhões, mais milhão menos milhão na preparação de um referendo sobre o tema não deverá fazer qualquer diferença. Diz o cavalheiro que será necessário fazer primeiro uma reavaliação. E só depois mexer na lei. Isso é normal. Só que ao mesmo tempo esclareceu que o PSD não tomará qualquer iniciativa nessa matéria. Então, pergunto, para que veio falar no assunto e avançar com novas ideias que ele próprio diz não figurarem no programa eleitoral do seu partido? Reavalia, dá a conhecer ao País a reavaliação e depois fica à espera do referendo? Ou aguarda que a alteração caia do céu? Não percebi a explicação, mas de caminho, certamente, far-se-á o referendo. O problema é que, diz ele, isso depende de uma coisa: “se houvessem vários cidadãos que quisessem…”. Ele diz bem, “se houvessem”, porque de outro modo ele nem sequer chegará a primeiro-ministro.

 

D. José Policarpo deve considerar as declarações do Dr. Passos Coelho sobre a interrupção voluntária da gravidez (que o Dr. Miguel Relvas há-de vir explicar mais tarde se ele não tiver percebido) de uma seriedade à prova de bala. Honestíssimas, diria eu.

 

Na Visão, um artigo do Prof. Freitas do Amaral chamou a minha atenção. Se ele fosse muçulmano e José Sócrates o líder de um país árabe eu diria que o jurisconsulto era militante da Al-Qaeda, tal a forma como se referiu a José Sócrates, lhe apontou os erros e se posicionou para vir a ser um interlocutor válido num próximo executivo liderado por Passos Coelho. Claro como a água. Admito sem qualquer dificuldade que quase tudo o que ele escreveu, quanto aos factos, é verdade. Porém, a única verdade que verdadeiramente interessa extrair do que ele escreveu é a de que José Sócrates não soube escolher aqueles de quem se rodeou – dentro e fora do partido –, e agora paga por isso. Não se pode agradar a todos. É dos livros e da vida. Um destes dias ouviremos o que Basílio Horta tem para dizer e que por enquanto, prudentemente, silencia.

 

O nosso também canta”, escreve o Expresso a propósito de Jerónimo de Sousa ter trauteado uma melodia de Lopes Graça, em Santa Maria da Feira. Também porque Passos Coelho, o outro rouxinol, ainda quando está rouco, não tem feito outra coisa senão cantar. Isto está tudo do avesso. Os “Homens da Luta”, em vez de estarem a fazer campanha, andam pela Eurovisão. O presidente do PSD, que devia estar na Eurovisão ou num estúdio qualquer a gravar  o “às duas por três quem sabe onde isto irá parar?” antes de dizer bem bom e pedir o café da manhã, anda em campanha e quer ser primeiro-ministro.   

 

O Dr. Marques Mendes, que quando a televisão faz o favor de o trazer até lá casa é mais conhecido pelo ternurento nome de “topo gigio” devido à forma como se agiganta à medida que o discurso avança, veio ontem dizer que “não há terceira via”. E eu que o diga. Da última vez que atravessei a ponte, a 25 de Abril, senti a falta de uma quarta e até de uma quinta via. As outras pontes têm vias que cheguem. Na de Abril escasseiam cada vez mais. E agora sem um Almerindo nas estradas (foi contratado pela concorrência) é que vai ser o bom e bonito. Já faltou mais para regressarmos à terra batida.

 

O Presidente da República deve andar sem saber o que fazer à vida. O PSD quer uma maioria absoluta. Confessou-o há dias. Não quis fazer uma coligação pré-eleitoral porque estava convencido de que ao fim de seis anos de governo socialista bastaria a Passos Coelho cantar  meia dúzia de larachas e tirar umas fotografias no sofá. Quando o seu líder começou a perceber que ficava pendurado e que o combustível estava a falhar para a descolagem, ainda que contando com os votos do CDS para formar uma maioria parlamentar, veio falar em maioria absoluta e sacou da artilharia. Isto é, trouxe “a tralha” para a estrada. Do bebé da incubadora aos dos ovos Kinder, só dei pela falta de Henrique Chaves. Seguro é que o PSD não aceitará governar com o PS, que, por seu turno, admite governar com quem lhe der a mão. Ou o braço. O Bloco e a CDU, como sempre, andam cheios de feijões nos bolsos e não obtêm financiamento para cenários reais, pelo que preferem não ir a jogo. Do outro lado, Paulo Portas ameaça chegar aos 20%. E não estava rouco quando o fez. Concedendo às sondagens, por agora, o CDS/PP andará entre os 13% e os 14%. Nada o impede de chegar aos 20% ou mais se Passos Coelho, depois da proposta do novo referendo à interrupção voluntária da gravidez, prosseguir agora com a ideia de propor um referendo para a liberalização das drogas leves, caminho que poderá tornar Portugal “num dos países mais lucrativos”da União Europeia. Passos Coelho deve ansiar ver o défice e o FMI com outros olhos, mais alaranjados, e esse poderia ser um bom ponto de partida. De caminho talvez se poupasse ao incómodo de ter de formar governo e de enfrentar as sempre sóbrias críticas do Dr. Alberto João Jardim.

 

O espectáculo não durará sempre.

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