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Delito de Opinião

Convidada: CATARINA REIS DA FONSECA

Pedro Correia, 25.02.11

  

'Changement': do branco ao negro

 

Haja a leve suspeita de que possa ser minimamente mainstream e lá vêm todos os argumentos possíveis e imaginários dos gurus do cinema para o carimbar com a palavra  "mau".

Há algumas coisas que podem não fazer muito sentido em Black Swan, como a associação entre questões sexuais ("go home and touch yourself") a um lado negro da personalidade de Nina ou certas cenas com demasiado sangue à mistura. Mas Black Swan é só isso? E o contraste perfeito das cores?  O confronto permanente entre branco e negro? O bem e o mal, a sanidade e a loucura, a lucidez e a alucinação, a racionalidade e a obsessão. A obsessão existe na vida real. Aronofsky não a inventou, lamento. 

Li algures na blogosfera que "as feridas nos dedos dos pés" estão entre as coisas de arrepiar deste filme. E como são então os pés de uma bailarina profissional? Não sangram, não têm feridas de arrepiar? Várias bailarinas profissionais já comentaram o filme. Dizem que o nível de competição não chega a este extremo, mas também não negam a exigência, o sangue nos dedos, as dietas infindáveis, o sofrimento necessário para que tudo pareça, aos olhos do público, simples, fácil e indolor.

 

 

E Natalie Portman não convence? Chamemos então a prima ballerina da New York City Ballet, essa com certeza convencerá, só não é actriz. É Portman em pontas na cena final do filme. É Portman em pontas em tantas outras e parece-me credível. Se não convence, chamemos a prima ballerina então, ela convencerá e dispensamos Portman e a duplo que fez as cenas mais complicadas. Teremos de passar a dispensar muitos outros actores sendo assim.

O filme choca, não é leve, não é só o drama de uma bailarina que quer ser perfeita. É o problema psicológico de uma bailarina jovem, obcecada, com alucinações, que se auto-mutila, que se auto-mutilava já antes de ter sido nomeada bailarina principal n' O Lago dos Cisnes. Com certeza que nunca ninguém ouviu falar de auto-mutilição. Que horror, vamos guardar isso para os filmes de terror porque nestes podemos ferir susceptibilidades.

Parece-me algo impossível classificar um filme como mau, ou muito mau, quando estamos a respirar de alívio na altura em que os créditos começam a passar. Um filme mau não  faz respirar de alívio, não deixa ninguém a pensar sobre ele nos dois ou três dias seguintes, não faz tentar perceber qual a distância que separa a realidade da alucinação. Pode não ser uma obra-prima é certo, longe disso, mas como mera espectadora (porque de especialista em cinema não tenho nada) acho que não merece, de todo, o desprezo que tenho lido em algumas críticas.

E já que vim ao Delito falar sobre o que não sei, correndo o risco de ser contrariada com argumentos cinematográficos de peso, com referências aos grandes clássicos ou a realizadores do cinema mudo francês, aproveito para sair sem fazer muito barulho, não esquecendo a devida vénia a "Sua Majestade", Colin Firth, pelo seu "discurso".

 

Catarina Reis da Fonseca

 

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