Tabaco e liberdades
Em dias seguidos, tropeço com discussões interessantes sobre aspectos que se relacionam com o consumo de tabaco. A primeira notícia (a Helena Matos já lhe fez referência), diz respeito a Espanha, onde El Observatorio para el Seguimiento de la Ley del Tabaco acaba de pronunciar-se no sentido de considerar que é proibido fumar em casa, durante o período de permanência de empregados domésticos. A segunda, diz respeito à prática já adoptada por empresas norte-americanas, nomeadamente hospitais, de recusar a admissão de pessoas que acusem o consumo de nicotina em testes realizados para o ofeito. Ora, devo dizer que a posição do Observatório espanhol me parece correcta. Em princípio, ninguém nos pode impedir de fumar em nossa casa. Todavia, quando esse é também o local de trabalho de um empregado doméstico, a situação altera-se. E, da mesma maneira que estamos vinculados a outros deveres (respeito, pagamento pontual da retribuição, etc.), o de proporcionar boas condições de trabalho e, em geral, de cumprir a lei, também deve ser assegurado. Entendimento diverso só pode partir, parece-me, de uma visão enviesada sobre o valor do trabalho em causa ou do facto de ser tipicamente desempenhado por mullheres. Ambas as situações são inaceitáveis. Não há nenhuma razão que justifique que um empregado doméstico não tenha direito a um ambiente sem fumo no seu local de trabalho e que tal seja garantido a um técnico de marketing de uma multinacional. No que diz respeito à prática das empresas americanas, considero que viola gravemente liberdades elementares. O consumo de tabaco nos EUA é, tal como em Portugal, permitido. Os testes em causa destinam-se a efectuar um juízo de probabilidade sobre a existência de doenças no futuro. Seleccionar candidatos com base nestes critérios (ou, no futuro, através de informação de ADN, por exemplo), é aplicar o princípio da eugenia, condenável em qualquer circunstância, numa questão tão essencial como o acesso ao emprego. Digo que o fumo e o tabaco continuam a ser bons pretextos a partir dos quais podemos testar o nosso entendimento sobre a liberdade e o modo como a queremos para nós ou a admitimos para os outros. Agora, se permitem, vou lá fora fumar um dos meus 30 cigarros anuais.