Convidado: PAULO ALMEIDA
Elisabete Matos
Quando li as primeiras linhas do convite da Ana Vidal, pensei tratar-se de um equívoco. O que poderia eu ter a dizer que interessasse aos leitores do Delito de Opinião? Logo a seguir encontrei a resposta e o convite tornou-se irrecusável.
Os jornais e as televisões contam-nos todos os dias o que sentiu o Cristiano antes e depois do golo e o país contém a respiração se se vislumbra a hipótese de um pequeno desentendimento entre Mourinho e o presidente do Real Madrid. Porém, se esquecermos o futebol, pouco se fala de quem tem sucesso fora deste pequeno país. Tão pequeno que quem é grande não cabe nele, perde a paciência para a pequenez dos grandes que cá mandam e vai à sua vida.
(A nossa special one da música, aqui nos agradecimentos na récita de estreia no Met, entre o tenor Marcello Giordani e o maestro Nicola Luisotti)
Elisabete Matos nasceu em Caldas das Taipas, estudou violino e canto em Braga e, graças a uma bolsa da Fundação Gulbenkian, continuou os estudos em Madrid, onde reside actualmente. Cedo começou a receber convites para cantar em Barcelona, Hamburgo, Tóquio, Milão, Nápoles, Roma, Washington, ao lado de José Carreras, Plácido Domingo, Deborah Polaski, com maestros como Barenboim, Muti, Maazel ou Mehta. Para a reabertura do Teatro Real de Madrid em 1997, após longos anos de obras, foi escolhida a ópera "Las Divinas Palabras", de García Abril, com Elisabete Matos e Plácido Domingo no elenco.
Por cá, devagarinho, alguém ia percebendo que tínhamos ali cantora e, com muita timidez, os primeiros convites foram surgindo, normalmente para papéis pequenos, não fosse Elisabete Matos não dar conta do recado. Foi preciso alguém chamar a atenção de quem de direito para a "Tosca" que Elisabete estava a cantar no Porto para que o Teatro de São Carlos a convidasse para esse mesmo papel. Em 2008, finalmente, Matos interpretou em Lisboa uma das maiores personagens da ópera italiana. A "Salome" prometida para a temporada seguinte não chegou a acontecer. Ou melhor: aconteceu, mas os desígnios do destino, que é como quem diz, quem dirigia o Teatro Nacional de São Carlos, não quiseram que ela a cantasse, perdendo-se assim a oportunidade de vermos Elisabete Matos estrear um grande papel do reportório straussiano em Lisboa.
No actual momento da nossa crise, as perspectivas não são risonhas. Elisabete Matos estará no concerto de abertura de Guimarães 2012 - Capital Europeia da Cultura, mas os seus projectos mais imediatos passam primeiro por Roma, numa nova produção de "Nabucco" que comemora os 150 anos da Unificação da Itália, com transmissão pelo canal Arte a 17 de Março (anote na agenda). Desejamos a Riccardo Muti uma rápida recuperação e que ele possa estar em Roma a dirigir essas récitas. Depois, entre outros compromissos, virão "Tosca" no Chile, "Turandot" em Las Palmas, "Macbeth" em Salzburgo, "Tosca" no Rio de Janeiro e o regresso a Nova Iorque. Em Dezembro do ano passado Elisabete Matos surpreendeu e deslumbrou o público do Met com a sua interpretação de Minnie, de "La Fanciulla del West", repetindo o sucesso uns dias mais tarde ao substituir, por motivo de doença, a all-American diva Deborah Voigt.
Já ouviu? Acrescente-se que o Met, onde as temporadas e os elencos são definidos com dois ou três anos de antecedência, convidou Elisabete para voltar já no Outono como Abigaille ("Nabucco").
Além do grande reportório italiano para soprano lírico-spinto e soprano dramático, Elisabete Matos aborda também as personagens wagnerianas de peso e acrescentou recentemente Isolda ao rol, papel que estreou em Oviedo escassas semanas após a Fanciulla do Met e com o qual obteve mais um enorme sucesso. O célebre Liebestod, a cena final de "Tristão e Isolda", foi registado durante o ensaio geral. Proponho que fiquemos agora com ele, na esperança de que alguém ali pelo Chiado se lembre da dívida para com Elisabete e reconheça a imprescindibilidade da sua Isolda no Teatro Nacional de São Carlos.