A Ensitel e a Maria João
Em tempos, alguém que trabalhou num departamento de apoio ao cliente de uma grande seguradora confidenciou-me que logo nos primeiros dias lhe fizeram chegar a advertência: "Este serviço serve para defender os interesses da empresa e não dos seus clientes." Mais: "Qualquer excesso de zelo relativo ao acompanhamento de um cliente será devidamente punido." Recordei-me deste episódio quando tomei conhecimento, através do post que Paulo Gorjão aqui deixou, da autêntica telenovela que se desenrola desde o início de 2009 entre a Ensitel e a nossa Maria João Nogueira, do Sapo. Lamento o que ela está a passar, mas se o seu caso tem algum mérito é o de constituir um exemplo para todos nós, incautos consumidores, pelos melhores e pelos piores motivos, por isso merece ser amplamente divulgado.
Vale a pena consultar todos os links que MJN alinhou para percebermos como é que uma simples reclamação pode evoluir para um processo em tribunal. Se tal aconteceu foi apenas porque MJN decidiu não abdicar dos seus direitos e ser mais forte que todo o sistema, que devido à nossa irrelevante cultura cívica, ainda se consubstancia em torno dos interesses das organizações e não dos seus utentes ou clientes. Como a cultura é esta, a expectativa é a de que os queixosos desistam. Desistir é tão normal que se alguém se recusa a fazê-lo provoca estranheza junto de quem lhe é próximo. No caso da empresa visada, hostilidade.
O tempo em que o cliente tinha sempre razão, já era. Agora, perguntam-nos, untuosos, em que nos podem ser úteis, ao mesmo tempo que tecem as linhas com que nos hão-de neutralizar, entre sorrisos. Mas mudar este modelo não é complicado. Basta fazer bem o nosso papel, que é o de não ceder à primeira dificuldade. A perseverança da Maria João é, neste contexto, um acto de cidadania. Houvesse ao balcão destas empresas pepsodent meia dúzia de melgas como ela por dia e a situação tornar-se-ia insustentável. A arrogância e a falta de transparência passariam a ser inviáveis do ponto de vista comercial e os consumidores teriam uma vida muito mais tranquila.
Parabéns, Maria João, e boa sorte.