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Delito de Opinião

Heróis e Afinadores de Piano

Laura Ramos, 26.12.10

Ninguém no seu juízo perfeito prefere um Político a um Homem Bom.

 

Mas ainda que a desconfiança pelos profissionais da res publica nos roa, todos precisamos de poder avaliar o potencial político concreto de um candidato: o que fez; como fez; que valores defendeu no terreno, na hora H; como se posicionou nos momentos cruciais e nas pequenas ou grandes querelas nacionais.

 

Em cada round das presidenciais temos este fenómeno: cai-nos do céu um romântico empedernido, um poeta do verbo ou um poeta de causas, como se o topo do Estado fosse um espaço não qualificado, um porto franco, uma superação de si próprio.

Desta vez, desgraçadamente, foi o missionário que acordou um dia e, em mais um arroubo de altruísmo,  resolveu passar a considerar Portugal a sua próxima obra humanitária. Ai de nós…

 

Nisto, não há que hesitar. Há as possibilidades. E as probabilidades eleitorais.

Falamos de coisas diferentes, porque o cálculo de probabilidade convoca já a ideia de acção, de moção viável (apenas nos fixamos na avaliação do lance).

Mas o cálculo da possibilidade remete-nos para um estado anterior, que é – ainda- o da mera aptidão para agir, para mover. Para, politicamente, ser.

 

Na sua indiscutível vocação universal, Fernando Nobre confunde tudo. Não tem cultura política. Define metas que não estão ao alcance de um Presidente da República. Ilude-se a si próprio e ao eleitorado quando faz do cargo a que se candidata aquilo que não pode ser. Quando acredita que o Estado português é um permanente estado de emergência, onde a legitimidade substitui a legalidade e a salvação se pratica por imperativo ético, num irreprimível exercício de heroicidade.

Quando diz, indignado, que «ainda vivemos nessa coisa do século passado», a propósito da sua não definição entre direita ou esquerda, o candidato devia lembrar-se que esta coisa dos destinos políticos espontâneos e impreparados é que, é -  sim, justamente -, um fenómeno atávico e do século passado.

 

Portugal não convoca heróis para a Presidência. Convoca, sim, um afinador de pianos.

 

Nada a fazer...

 

- You’re impossible, Mr. Nobre!

2 comentários

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    Laura Ramos 28.12.2010

    Obrigada, Pedro. Já sei que é um fã do Zé Manel dos Ossos. Eu, como boa autóctone... já enjoeei. Ou melhor: zanguei-me a partir do dia em que uma maternal senhora me obrigou (literalmente) a comer a sopa até ao fim. Uma substancial sopa, diga-se.
    Já lá não vou há anos. Mas numa das suas próximas voltas faço questão de lhe mostrar uma ou outra boa opção.
    E ainda me há-de contar essa de ter sido feliz em Coimbra (já sei que fica perto da Figueira, mas mesmo assim... ?! :-)
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