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Delito de Opinião

Convidada: PRISCILA RÊGO

Pedro Correia, 15.12.10

 

Instituições

 

A maior parte dos economistas acredita que as instituições são exógenas. Desde Adam Smith que direitos de propriedade sólidos, tribunais imparciais e mecanismos de resolução de conflitos viáveis são vistos como o interruptor institucional que liga e desliga o crescimento económico. E esta é a posição standard de organismos como o FMI ou o Banco Mundial. Mas o crescimento resulta das boas instituições ou são os países com condições para crescer que criam boas instituições para realizar esse potencial?

Note-se que nem todas as instituições têm de ter a grandiosidade de uma Igreja ou de um sistema político. Há coisas mais comezinhas a quem o título também assenta bem. O Congressional Budget Office (CBO), por exemplo, é igualmente uma instituição. Presta auxílio técnico ao Congresso americano na análise do Orçamento dos Estados Unidos e fornece informação credível e acessível a quem não tem recursos, tempo ou dinheiro para estudar a forma como as contas públicas vão sendo geridas.

Os apologistas do regime, alguns dos quais portugueses, dizem que a existência de um organismo como o CBO torna o processo orçamental mais fiável, seguro e transparente. Talvez Portugal pudesse fazer o mesmo. Só que uma boa razão para o facto de o CBO existir reside provavelmente no facto de os cidadãos e políticos americanos terem interesse num processo orçamental fiável, seguro e transparente. Em Portugal, esse desejo tem permanecido oculto, quer da parte dos eleitores, quer da parte dos eleitos. O que também não é de estranhar, dado que são uns que elegem os outros. Mas não estou a querer insinuar nada.

Em Portugal, de qualquer maneira, o Governo aceitou finalmente rodar um pouquinho mais o botão da instituição orçamental: a Lei de Enquadramento Orçamental (LEO) vai ser alterada para incluir algumas salvaguardas que outros países desenvolvidos já têm. A mais importante é a regra do défice, que baliza em termos legais o saldo das Administrações Públicas. Pelo que me apercebi, a coisa funciona mais ou menos assim: a LEO fixa um objectivo de médio prazo para o défice e o Governo tem de apresentar um plano a quatro anos com metas orçamentais coerentes com os objectivos.

O que acontece se o objectivo for falhado? No ano seguinte, o Governo terá de restringir ainda mais o Orçamento, de forma a cumprir o objectivo inicialmente fixado para o quarto ano. E se falhar no segundo novamente? Nesse caso, a rédea fica ainda mais curta – e a exigência aumenta para o terceiro exercício anual. Se a situação se repetir, então todo o esforço é empurrado para o último ano, altura em que a meta presente na LEO tem obrigatoriamente de ser cumprida. Se não for…

Bom, se não for caberá ao eleitor fazer o seu juízo político e punir o Executivo nas eleições seguintes. A alteração à LEO vai fazer com que o povo possa, de forma muito democrática, responsabilizar o Governo por infringir uma norma que certamente não conhece e de cuja transgressão terá sido, com toda a probabilidade, beneficiário directo. Vai ficar tudo na mesma. Mas, desta vez, escrito na Lei.

Não me entendam mal: não estou a criticar a alteração. Sendo os portugueses o que são, um regime mais duro não seria, provavelmente, aprovado no Parlamento. Mas o caso chama a atenção para a possibilidade de as instituições serem uma emanação da sociedade e não um constrangimento que se lhe pode impor. É como as elites: cada povo produz as que pode. O sucesso dos nórdicos talvez não esteja nas instituições, elites ou políticos que lhes caíram em sorte. Mas sim em terem cidadãos atentos, interessados e responsáveis. Portugal teve azar: ficou só com os portugueses.

 

Priscila Rêgo

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