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Delito de Opinião

'Artitectura': os mal-amados (19)

João Carvalho, 28.11.10

Jardine House, em Hong Kong

A Jardine House (ou Connaught Centre, ou Cheung Kong Center) é uma torre de escritórios na ilha de Hong Kong, no número 1 da Connaught Place, em Central, bem junto das águas do enorme porto de águas profundas. O projecto foi da Palmer & Turner, encomendado pela Hongkong Land Ltd., subsidiária do Grupo Jardines.

Trata-se da multinacional Jardine Matheson Holdings, com sede em Hong Kong, que opera nas Bermudas, está cotada em Singapura e em Londres e se movimenta em muitos pontos do mundo sob várias designações e marcas, um gigante do mercado que serviu de fundo ao filme Nobel House (realizado por Gary Nelson em 1988, baseado no romance com o mesmo título de James Clavell e com Pierce Brosnan no papel de tai pan, o grande patrão estrangeiro).

O edifício — que substituiu um prédio de 1948 com 16 andares da mesma empresa, mas situado noutra área — construído em 16 meses num aterro conquistado ao mar, com 52 andares e uma altura de 178,5 metros até ao topo, marcou o início da modernidade arquitectónica em Hong Kong: foi concluído em 1972 e inaugurado em 1973; até 1980, era o mais alto da Ásia. Foi também pioneiro de uma técnica que passou a tornar-se comum desde então na zona Central de Hong Kong, que consiste em acessos interligados entre as inúmeras torres aí erguidas. Com as vias quase exclusivamente destinadas ao trânsito frenético, poucos locais para estacionamento no espaço público e raros passeios para peões, o processo permite que as pessoas circulem de edifício em edifício (centros comerciais, hotéis, etc.) através de escadas e passadeiras rolantes, sempre no conforto do ar-condicionado.

Pelo lobby, no piso térreo, percebe-se que a frieza do ambiente corresponde à utilização de materiais de grande resistência e limpeza fácil, onde se encontram os elevadores (da Otis) e a respectiva caixa de escadas (da Schindler).

Nestas décadas recentes, os espantosos exemplos da paisagem urbana de Hong Kong, a par de Manhattan (Nova Iorque), são estudados em todos os cursos de arquitectura e têm feito muitas capas das melhores revistas da especialidade em todo o mundo.

Hoje em dia, a Jardine House está completamente diluída na mancha imensa e arrojada das enormes construções naquele território chinês "fundado" pelos britânicos e desenvolvido pelo comércio norte-americano internacionalizado. O edifício confunde-se e quase desaparece entre os monstros que o rodeiam, é certo, mas não era assim nos anos 70.

Portanto, não pode dizer-se que passava indiferente quando surgiu aos olhos admirados da população, com as suas janelas redondas (diz-se que são 1700 vigias) incapazes de disfarçar a massa cinza metálica que o sustenta. Essa admiração, na altura, oscilou entre um certo orgulho pela grandeza e alguma desconfiança pela ostentação.

Na sua primeira década, a Jardine House dos postigos redondos foi realmente um mal-amado, logo baptizado pela vox populi com um nome que me parece que só um chinês, com as suas metáforas e alegorias muito próprias, se lembraria de chamar-lhe (e que me dispenso de traduzir): The Building of 1000 Assholes...

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