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Delito de Opinião

Ceci n'est pas un post (21)

Ana Vidal, 03.02.11

 

Há dias assim

 

Há dias assim. Inteiros, redondos, assustadoramente completos. Como uma síntese da vida, toda ela, para que não nos esqueçamos de nenhuma das suas etapas. Que começam com uma aurora magnífica, uma verdadeira explosão de vida, e acabam num suicídio colectivo de estrelas desesperadas, como anjos caídos em desgraça. Pelo meio, uma tarde em que a morte nos reclama, lembrando-nos de que até os nossos sonhos lhe pertencem. Que só os temos de empréstimo. A prazo. Há dias assim. Em que a terra treme e se revolta sob os nossos pés. Em que nada, nem ninguém, pode preencher os interstícios da nossa solidão. Em que um allegro matinal sucumbe sem remédio a um adagio vespertino que antecipa já, por sua vez, um inevitável requiem nocturno. Há dias assim. Feitos de espanto e de torpor. De glória e de derrota. De risos e de lágrimas. Da luz mais alta e das mais fundas sombras. De caminhos inesperados, improváveis. Impossíveis de percorrer. De um céu aberto por um sol resplandecente e fechado por uma lua nova, embuçada em brumas. Há dias assim. Inteiros, redondos, assustadoramente completos. Como uma síntese da vida.

 

(Imagem: René Magritte - Les Mémoires d’un saint)

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