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Delito de Opinião

21D na Catalunha: uma bizarria, um paradoxo e o marasmo

Diogo Noivo, 22.12.17

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 Gráfico El País

 

Ao contrário do dito referendo do passado dia 1 de Outubro, as eleições de ontem na Catalunha ofereceram garantias de liberdade e de transparência. Por essa razão, e por terem sido antecedidas por um período de enorme radicalização em torno da independência, as eleições de ontem foram o verdadeiro plebiscito ao desejo de secessionismo na Catalunha. A importância do acto eleitoral reflecte-se na afluência às urnas, que rondou os 82%, superando o recorde de 79,9% verificado em 1982. É uma participação impressionante, principalmente porque a votação ocorreu num dia laboral.

 

Os eleitores votaram em partidos, mas, uma vez que estava em causa a independência, o poder afere-se mediante a diferença de força entre dois blocos: o dos partidos independentistas; e o dos partidos constitucionalistas. O resultado foi claro: a maioria pretende que a Catalunha continue a fazer parte de Espanha, com 52% dos eleitores a votar em partidos constitucionalistas. No entanto, o método de conversão de votos em mandatos dá a maioria absoluta ao independentismo no Parlamento. O independentismo perdeu votos e perdeu mandatos (tinha 72, fica com 70). Sofre um recuo significativo, mas ainda assim conserva a maioria absoluta (que se faz com 68 deputados). Ou seja, a maioria dos eleitores deseja continuar espanhol, mas a maioria dos deputados no Parlamento não. Assim, desta eleição resulta uma clara dissonância entre a vontade popular e a vontade dos representantes eleitos. É bizarro, além de pouco favorável à confiança dos eleitores na democracia.

 

Ao bizarro junta-se um paradoxo: o nacionalismo radical e segregador do procés fez do Ciudadanos – força política que concilia o catalanismo com a identidade nacional espanhola – o partido mais votado. É a primeira vez que as eleições catalãs são ganhas por um partido que não é abertamente nacionalista. O Ciudadanos surge em 2006 com apenas 3 deputados e consegue agora 37, tornando-se o partido mais votado e com mais mandatos na Catalunha. É um resultado extraordinário. Dividindo os eleitores por partidos, a maioria disse sentir-se catalã e entende que essa identidade é compatível com a cidadania espanhola. Afinal, e contrariamente ao afirmado pelo independentismo radical, a Catalunha e o catalanismo são plurais.

 

Por fim, o marasmo. O bloco independentista recuou bastante, tendo menos votos do que o bloco constitucionalista. Perde votos e mandatos, razão pela qual dificilmente terá força para impor a independência. A isto acresce que os dois principais partidos independentistas, Junts per Cat e ERC, obtiveram resultados semelhantes. Dado o equilíbrio de força entre os dois, e as picardias que os separam desde 1 de Outubro, espera-se luta fratricida pela hegemonia no bloco independentista. Por último, os radicais anti-globalização da CUP passam de 10 para 4 deputados, perdendo peso político e, dessa forma, condições para mediar o potencial conflito entre o Junts per Cat e ERC. Será difícil que os independentistas ofereçam uma solução governativa estável e duradoura. No bloco oposto, o cenário é diferente, embora o marasmo seja o mesmo. Têm mais votos, mas não têm mais mandatos. O Ciudadanos obtém uma vitória histórica e estrondosa, mas o Partido Popular sofre uma derrota pesada e o Partido Socialista da Catalunha não cresce o suficiente para ajudar o Ciudadanos a formar governo. Tudo somado, a Catalunha continua ingovernável.

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