Ceci n'est pas un post (9)
L’important
L’important c’est la rose, cantava ele naquela voz que nos aveludava os dias, nos deixava as pernas a tremer e os olhos brilhantes. E cantávamos nós com ele, aveludados na premissa sagrada. Era tão fácil. A nossa vida era, toda ela, feita de rosas. Importantes, sim. O que podia haver mais importante do que os nossos magníficos, preciosos, deslumbrantes umbigos? Nesse tempo, o mundo real era a nossa imensa fantasia. Ainda as rosas não tinham espinhos. Ainda os espinhos não se tinham transformado em punhais. Ainda nós não éramos gente de carne e osso, mas apenas bolas de sabão planando no ar leve da manhã. Belas, coloridas, etéreas. E tão inconsistentes. L’important c’est la rose, dizíamos, com a inabalável convicção dos inconscientes. Sabíamos lá nós o que isso queria dizer. Não conhecíamos a rosa porque éramos nós a rosa, inebriada com o seu próprio perfume. Só muito mais tarde o descobrimos, quando já não havia rosa, nem espinhos, nem sequer punhais. Quando o Bécaud se calou em nós e nos emudeceu, entendemos finalmente: l’important c’est la rose. Crois moi.
(Imagem: René Magritte)